DÚVIDAS

A sintaxe do verbo transformar II

Na frase «Eu transformei o príncipe num sapo», qual a função sintática desempenhada pelo segmento «num sapo»?

Eu interpreto como um complemento oblíquo (X transformar Y em Z), no entanto, perguntaram-me se não poderia ser interpretado como predicativo do complemento direto.

Os meus agradecimentos pelo excelente trabalho que fazem.

Resposta

As duas análises apresentadas poderão ser justificáveis em função do contexto em que se pretende promover o estudo gramatical.

O verbo transformar pode ser considerado um verbo transitivo direto e indireto com o sentido de “tornar diferente do que era”. No quadro desta análise, o verbo terá dois argumentos: um complemento direto e um complemento oblíquo. Esta será, eventualmente, uma análise mais ajustada ao quadro do ensino do 3.º ciclo.

Não obstante, uma análise mais fina pode permitir considerar o verbo transformar entre os verbos transitivo-predicativos de tipo resultativo, os quais «denotam a criação de uma entidade (construir, elaborar, escrever, fazer) […] denotam eventos em que uma entidade sofre um determinado processo do qual sai transformada (cortar, mastigar)»1. Teremos verbos transitivo-predicativos nas seguintes frases:

(2) «Construí a casa pequena.» (= «Construí-a pequena.»)

(3) «Fiz o trabalho bonito.» (=«Fi-lo bonito.»)

(4) «Cortei o pão em fatias finas.» (=«Cortei-o em fatias pequenas.)

Esta análise implica que os constituintes pequena, bonito e «em fatias finas» desempenham a função de predicativo do complemento direto.

No âmbito deste quadro, o verbo transformar pode ser considerado transitivo-predicativo uma vez que, na frase apresentada, também denota um processo de transformação do príncipe em sapo:

(5) «Eu transformei o príncipe num sapo.»

De acordo com esta análise, o constituinte «num sapo» terá a função de predicativo do complemento direto.

Esta análise é mais ajustada ao campo de reflexão gramatical desenvolvida em contexto universitário.

Disponha sempre!

 

1. Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, pp. 1355-1356.

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