A aceitabilidade da expressão estará dependente do valor que se atribui aos verbos que dela fazem parte.
A construção em causa poderá ser interpretada como composta por um verbo auxiliar (acabar (de)) e por um verbo principal (começar) ou poderá ser considerada uma construção elíptica, na medida em que se omite o verbo principal, que indicará a situação visada. A frase a considerar poderá, deste modo, equivaler à que apresentamos em (1):
(1) «Acabei de começar a ler este livro.»
Nesta segunda possibilidade, temos, assim, uma frase que inclui um verbo principal (ler) e dois verbos auxiliares aspetuais (acabar (de) e começar (a)1).
Recorde-se que como verbo auxiliar acabar (de) pode desencadear duas leituras2:
(i) uma leitura aspetual em que aponta para a finalização de uma situação:
(2) «Acabou de ler este livro.»
(ii) uma leitura temporal, que indica que a situação ocorreu num intervalo de tempo anterior e muito próximo do momento de enunciação:
(3) «O João acabou de chegar.»
Por seu turno o verbo começar (a), na qualidade de auxiliar, assinala o início de uma situação3:
(4) «O João começou a ler este livro.»
Poderemos ainda acrescentar que, quando dois verbos auxiliares se combinam numa frase, a organização entre eles deve respeitar a ordem verbo auxiliar temporal + verbo auxiliar aspetual, tal como acontece em (5):
(5) «o João vai [auxiliar temporal] começar a [auxiliar aspetual] ler este livro.»
Perante o que ficou exposto, a sequência apresentada pela consulente é aceitável se existir um verbo principal elidido e se o verbo auxiliar acabar (de) tiver uma leitura temporal, o que poderá ser confirmado pela possibilidade de introdução na frase da expressão «mesmo agora»4 que reforça o valor temporal de acabar (de):
(6) «Acabou mesmo agora de começar a ler este livro.»
Se na frase apresentada, o verbo começar funcionar como verbo principal, a construção já será rejeitada por alguns falantes porque acabar (de) será um verbo aspetual que marca o início de uma situação e começar, por seu turno, terá o valor de «principiar» que é sentido como redundante face ao verbo auxiliar.
Disponha sempre!
1. Por uma questão de simplificação, referirmo-nos aos dois verbos como auxiliares. Todavia, note-se que o verbo começar (a) é classificado como semiauxiliar. Segundo Mira Mateus, os semiauxiliares são «verbos esvaziados de significado lexical, sem grelha argumental, que respondem afirmativamente a alguns mas não a todos os critérios de auxiliaridade (os quais, recorde-se, são: impossibilidade de completiva finita, um só advérbio de tempo de cada tipo, uma só negação frásica (precedendo o auxiliar), atracção obrigatória do clítico pelo verbo auxiliar)». (Gramática da Língua Portuguesa. 203, p. 315).
2. cf., Cunha in Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, pp. 613.
3. cf. Idem, Ibid., pp. 609-610.
4. Cf. Raposo in Idem, ibid., pp. 1270-1271.