O verbo caber ocorre na frase com o sentido de «convir, justificar-se» e como verbo intransitivo*, concordando no singular com o seu sujeito, que é a oração de infinitivo que «prestar» subentende. Esta oração fica explícita, se, suprimindo a construção relativa «que...prestar....» associada a essa oração de infinitivo, empregarmos a expressão «qualquer coisa» em lugar do pronome relativo que e a colocarmos depois do verbo prestar, conforme o exemplo 1:
1. «Cabia [prestar qualquer coisa].»
Em 1, «prestar qualquer coisa» é uma oração de infinitivo que é o sujeito de «cabia»; «qualquer coisa», por seu lado, tem a função de objeto direto (o mesmo que complemento direto). Daqui se infere que, na discussão da frase «são estes os esclarecimentos que cabia prestar», o pronome relativo que terá a mesma função no âmbito da oração em que ocorre («que... prestar»).
Cabe assim notar notar que «que... prestar» é uma construção relativa que faz parte da frase «são estes os esclarecimentos que nos cabia prestar». Se a construção relativa não ocorresse, o mais provável seria que a frase em questão correspondesse à seguinte sequência de frases a que falta articulação:
2. «São estes os esclarecimentos. Cabia prestar os esclarecimentos.»
A construção relativa evita repetições, substituindo a segunda ocorrência de «esclarecimentos» pelo pronome relativo que, o qual tem de se deslocar para o começo da construção relativa, de modo a obter uma frase complexa gramatical, como no seguinte exemplo:
3. «São estes os esclarecimentos [que cabia prestar].»
Em 3, também é de realçar que o pronome relativo que, para ter sentido, tem de estar próximo de um substantivo, que é o seu antecedente e que, neste caso, é «esclarecimentos». Não é, portanto, possível uma sequência como «são estes os esclarecimentos cabia que prestar», com pronome relativo entre cabia e prestar, porque o que ficaria impedido de se ligar diretamente ao antecedente nominal.
Voltando ao exemplo 2, deve ainda observar-se que a segunda frase («cabia prestar esclarecimentos») tem uma estrutura complexa, porque nela se insere uma oração subordinada completiva não finita de infinitivo («prestar alguma coisa» – ver exemplo 1, acima), com a função de sujeito de «cabia». Sendo assim, o verbo caber concorda no singular como se a oração de infinitivo fosse o mesmo que isso:
4. «prestar X [= os esclarecimentos] cabia» → «isso cabia»
Em 4, para apoio desta explicação, a oração de infinitivo aparece no começo da frase, que é a posição mais habitual do sujeito em frases muito simples como «o João comeu um bolo» (o sujeito é «o João»). Mas o sujeito nem sempre é uma expressão nominal e nem sempre figura no princípio da frase; na verdade, como acontece no exemplos 1, o sujeito pode ser uma oração a ocorrer depois do verbo.
Em síntese, a frase em análise – «são estes os esclarecimentos que nos cabia prestar» – é, portanto, complexa, isto é, integra uma sequência tradicionalmente chamada oração subordinante («são estes os esclarecimentos») e uma oração subordinada relativa («que nos cabia prestar») associada a uma oração completiva de infinitivo («prestar [qualquer coisa]»). A oração subordinada relativa é introduzida por que, cujo antecedente é «esclarecimentos», e que não é o sujeito de caber, mas, sim, o objeto direto (ou seja, o complemento direto) de prestar.
* O uso intransitivo de caber encontra-se registado, por exemplo, no Dicionário Gramatical dos Verbos Portugueses (Lisboa, Texto Editores, 2007), com o significado de «convir», podendo ter como sujeito ou uma expressão nominal – «[estas discussões] não cabem» (idem) –, ou uma oração não finita – «caberá [estudar convenientemente o impacto ambiental do projeto urbanístico]» – (idem).