Sara de Almeida Leite - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara de Almeida Leite
Sara de Almeida Leite
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Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, variante de Português e Inglês, pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa; mestre em Estudos Anglo-Portugueses; doutorada em Estudos Portugueses, especialidade de Ensino do Português; docente do ensino superior politécnico; colaboradora dos programas da RDP Páginas de Português (Antena 2) e Língua de Todos (RDP África). Autora, entre outras obras, do livro Indicações Práticas para a Organização e Apresentação de Trabalhos Escritos e Comunicações Orais ;e coautora dos livros SOS Língua Portuguesa, Quem Tem Medo da Língua Portuguesa, Gramática Descomplicada e Pares Difíceis da Língua Portuguesa e Mais Pares Difíceis da Língua Portuguesa.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Em The Malaysian Consultative Council of Buddhism, Christianity, Hinduism, Sikhism and Taoism, qual é a melhor tradução para a preposição of: de ou para?

Resposta:

Em certos contextos, como neste, o significado das preposições de e para é muito próximo, e ambas podem ser usadas.

Aliás, após o nome «Conselho Consultivo» usa-se, em português, tanto uma como a outra. Por exemplo, existe o «Conselho Consultivo de Avaliação de Impacte Ambiental» e o «Conselho Consultivo para os Assuntos da Imigração». As preposições de e para encerram, neste contexto, a ideia de finalidade.

Pergunta:

No meu quotidiano de tradutor, vejo-me por vezes confrontado com situações consideradas normais na língua de origem mas não tanto na língua de chegada ou de tradução.

Por exemplo, em alemão é normal começar uma frase por e ou por ou em vez de se fazer sempre e obrigatoriamente o uso de vírgula.

É legítimo fazer o mesmo em português?

Resposta:

Embora as conjunções sirvam, por definição, para ligar orações, pode começar uma frase por e, ou, entre outras. Assim o atesta o uso de muitos autores consagrados, como os dois que aqui cito a título de exemplo.

«E a minha vida recomeçou, cronometrada a aulas, toques de sineta, a longos silêncios de cigarros no quarto da pensão, a vagabundagem pela cidade, sobretudo às horas da tarde» (início de um parágrafo de Aparição, de Vergílio Ferreira, Bertrand, 33.ª ed., p. 174).

«Se o confessor das Ursulinas lhe ensinara que nada vai tão mal ao prudente como irar-se, ela esqueceu-se. Ou então a ira, acendida nas veias, de furiosa não passa logo a branda [...]» (Agustina Bessa-Luís, Eugénia e Silvina, Guimarães, p. 239).

Pergunta:

Traduzi por «assassino serial» a expressão americana serial killer, por me parecer mais correcto que «assassino em série». Como recebi um protesto, e o tema não é consensual, gostaria que me fizessem o favor de informar qual é a expressão mais correcta.

Muito obrigado.

Resposta:

A expressão assassino em série está atestada no Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa, com o seguinte significado: «indivíduo que mata várias pessoas, com os mesmos métodos, sem motivo aparente».

O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa regista, no entanto, assassino sequencial, serial ou em série: «perpetrador de uma série de homicídios que têm ger. a mesma tipologia».

Pode haver divergência na designação mais usada em Portugal e no Brasil (eu diria que os Portugueses preferem dizer «assassino em série», e os Brasileiros, «assassino serial»), mas é legítimo usar qualquer uma das três.

Pergunta:

Tenho dúvida se existe em português e como se escreve a palavra portuguesa que corresponde a prodrug em inglês e que é muito utilizada nas ciências farmacêuticas. Será "pró-fármaco", "profarmaco", ou outra?

Agradeço a vossa explicação.

Resposta:

Os prontuários esclarecem que o prefixo pró- deve separar-se do radical que se segue por meio de hífen quando o seu significado é «a favor de». Ora, como não é esse o caso de pro- em "profármaco", que significará «à maneira de, em lugar de», poder-se-á escrever "profármaco", tal como pronome (e não "pró-nome").

Nos dicionários gerais de língua, o termo não está atestado. Mas o Dicionário de Termos Médicos de Manuel Freitas e Costa (Porto Editora, 2005) regista profármaco, sendo esta, portanto, a forma recomendável.

Ainda que se opte correntemente, por exemplo em textos que circulam na Internet, por "pró-fármaco", recomendo profármaco, pelas razões apontadas.

Pergunta:

Posturografia (termo médico) deve pronunciar-se com o "o" da primeira sílaba aberto, ou fechado? Penso que será fechado, mas já tenho ouvido dizer "pòsturografia".

Resposta:

 A pronúncia da palavra posturografia como "pusturugrafia" é natural em português europeu, dado que as primeiras vogais são átonas, para mais havendo quatro vogais átonas antes da tónica, que é i. Assim, compreende-se que o o inicial, bem como o o de ligação entre os radicais, perca a sua força. Aliás, nas palavras postura e postural acontece o mesmo e nelas temos menos vogais átonas.

A pronúncia "pôsturografia" (mais do que "pòsturografia") será mais natural no Brasil, onde as vogais átonas não são tão enfraquecidas como em Portugal. Parece-me artificial que um falante de português europeu diga "pòsturografia", do mesmo modo que seria estranho ouvir dizer "pòstura" em Portugal, em vez de "pustura" (para postura).