Sara de Almeida Leite - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara de Almeida Leite
Sara de Almeida Leite
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Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, variante de Português e Inglês, pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa; mestre em Estudos Anglo-Portugueses; doutorada em Estudos Portugueses, especialidade de Ensino do Português; docente do ensino superior politécnico; colaboradora dos programas da RDP Páginas de Português (Antena 2) e Língua de Todos (RDP África). Autora, entre outras obras, do livro Indicações Práticas para a Organização e Apresentação de Trabalhos Escritos e Comunicações Orais ;e coautora dos livros SOS Língua Portuguesa, Quem Tem Medo da Língua Portuguesa, Gramática Descomplicada e Pares Difíceis da Língua Portuguesa e Mais Pares Difíceis da Língua Portuguesa.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Há pouco, passei por uma ambulância que, entre outras inscrições normais, e que já nos habituámos a ver, ostentava a palavra "medicalizável". Julgo não ser difícil de concluir que se trata de uma palavra relacionada com actos médicos; no entanto, gostaria de saber qual o significado exato da palavra.

Trata-se de um neologismo?

Resposta:

A palavra "medicalizável" será formada por sufixação (“medicalizar” + vel) e o seu sentido deveria, à partida, ser «que se pode medicalizar», à semelhança do que acontece com contável («que se pode contar») e utilizável («que se pode utilizar»).

No entanto, para transmitir esse significado temos o adjectivo medicável, que significa «1 possível de ser medicado 2 que se pode tratar por meio de medicamento(s); curável», segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa.

O que acontece é que o neologismo "medicalizável" tem sido usado para veicular um significado diferente (daí ter-se sentido a necessidade de usar outro adjectivo, que não medicável): «que se pode equipar de médicos». Vê-lo consagrado nos dicionários será apenas uma questão de tempo, se o uso se mantiver.

Pergunta:

Qual seria a tradução mais correcta para a forma inglesa «the restaurant and bar is open...» e outras similares, como «bar-coffee shop» ou «lounge bar», por exemplo. Como ficaria melhor, «o restaurante e bar está aberto», «o restaurante-bar está aberto» ou «o restaurante e bar estão abertos»?

Antecipadamente grata pela vossa resposta.

Resposta:

Tudo depende dos locais em questão. Se os nomes restaurant e bar apresentam entre eles a conjunção and (e), podem ser espaços independentes, pelo que poderia ser mais correcto conjugar o verbo no plural, mesmo na frase em inglês: «the restaurant and bar are open», ou seja, «o restaurante e o bar estão abertos».

Se restaurante e bar constituem um espaço único, então consideraria duas hipóteses: usar o composto restaurante-bar, comum no uso, mas inexistente nos dicionários, ou usar uma barra entre os nomes: «o restaurante/bar está aberto». A opção «o restaurante e bar está aberto», apesar de ser mais fiel ao original, parece-me pouco correta, uma vez que o sujeito composto (nomes intercalados pela conjunção e) exigiria que o verbo estivesse conjugado no plural. Nesse caso, porém, faria falta o segundo determinante: «o restaurante e o bar estão abertos» (em vez de «o restaurante e bar estão abertos»). Esta opção, todavia, leva a crer que restaurante e bar são espaços independentes.

A respeito das outras formas inglesas mencionadas:

Lounge Bar: Bar/sala de estar

Bar-coffee-shop: Café/Bar ou Bar/Cafetaria, ou ainda Cafetaria/Bar

Pergunta:

Fiquei confusa com uma explicação que Sara Leite deu no dia 8 de Fevereiro de 2008 relativamente à indeterminação do sujeito e ao facto de se poder usar pronomes indefinidos para indeterminar o sujeito. Eu sempre pensei que os pronomes indefinidos, semanticamente, remetiam para um sujeito sem determinação definida, mas que, sintacticamente, desempenhavam a função de sujeito simples. Não sei se isto consiste em alguma alteração trazida pela TLEBS. Agradeço desde já a disponibilidade (que sempre demonstram) para esclarecer esta minha dúvida.

Resposta:

A resposta que dei sobre a indeterminação do sujeito não tem qualquer relação com as alterações introduzidas pela TLEBS.

Percebo que a consulente tenha estranhado o facto de eu sustentar que, na frase «Alguém chegou às seguintes conclusões», o pronome indefinido exprime a indeterminação do sujeito. De facto, em termos puramente gramaticais, ou estruturais, o pronome indefinido representa o sujeito. Mas em termos puramente semânticos, pensando apenas no sentido que se está ali a veicular, podemos dizer que “alguém” representa um sujeito indeterminado na medida em que esse pronome indefinido tem o mesmo significado que a partícula “se”, quando esta serve para representar a indeterminação do sujeito. Neste caso, tem-se conta o significado da palavra alguém: «uma pessoa ou alguma pessoa cuja identidade não é especificada ou definida» — nos termos do Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa.

Pergunta:

Como se lê a palavra "freeport"?

Resposta:

O termo composto freeport é de origem inglesa (trata-se de um topónimo que significa, literalmente, «porto livre»). Assim, deve pronunciar-se, tanto quanto possível, tal como os falantes anglo-saxónicos o pronunciam: [friport] — pese embora a inevitável diferença entre o “r” inglês e o português, bem como o som das vogais “i” e “o”, que também não têm exactamente a mesma qualidade em inglês e em português. Em todo o caso, não há qualquer razão válida para omitir o som do “t” final, como fazemos com as palavras de origem francesa, como croissant.

Pergunta:

Será correcto empregar a palavra inauguração na tradução de inauguration quando se refere à tomada de posse do presidente dos Estados Unidos da América?

Resposta:

Em Portugal, talvez seja mais frequente usarmos a expressão tomada de posse nesse contexto, pois costumamos falar de inaugurações sobretudo quando se trata de proceder à abertura solene de uma obra, edifício, exposição, etc.

Porém, o substantivo inauguração também pode ser empregado com o sentido genérico de «o primeiro momento da existência; início, começo», conforme atesta o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, que fornece o seguinte exemplo: «a i. [inauguração] de um novo regime político».

Não vejo, portanto, objecção a que a palavra inauguração seja usada para designar o momento em que um presidente se estreia enquanto tal.