Sara de Almeida Leite - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara de Almeida Leite
Sara de Almeida Leite
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Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, variante de Português e Inglês, pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa; mestre em Estudos Anglo-Portugueses; doutorada em Estudos Portugueses, especialidade de Ensino do Português; docente do ensino superior politécnico; colaboradora dos programas da RDP Páginas de Português (Antena 2) e Língua de Todos (RDP África). Autora, entre outras obras, do livro Indicações Práticas para a Organização e Apresentação de Trabalhos Escritos e Comunicações Orais ;e coautora dos livros SOS Língua Portuguesa, Quem Tem Medo da Língua Portuguesa, Gramática Descomplicada e Pares Difíceis da Língua Portuguesa e Mais Pares Difíceis da Língua Portuguesa.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

A minha pergunta é muito simples: constitui um erro ortográfico a supressão da consoante c na forma escrita da palavra profilácticas? Oiço muitas vezes falar da supressão das consoantes mudas, à luz dos acordos ortográficos, mas, segundo informação do ILTEC, ainda está em vigor o acordo de 1945...

Sei que a supressão do c em questão é comum no português do Brasil. E no português de Portugal? Constitui um erro grave escrever «medidas profiláticas»? Todos os dicionários que encontrei dizem-me que sim... mas gostava de saber se a utilização do c em questão é facultativa.

Obrigado.

Resposta:

Na verdade, a utilização do c mudo não é facultativa, de acordo com a norma do português europeu. É tão incorrecto escrever "profilático" como "ato" (em vez de acto) ou "aspeto" (em vez de aspecto).

Se e quando nos regermos efectivamente pelo acordo de 1990, então, sim, poderá grafar essa e outras palavras sem o c mudo.

Nota: as regras do Formulário de 1943 admitem, para o Brasil, que se escreva com ou sem c palavras como profiláctico/profilático e aspecto/aspeto, pois esta consoante  pode ser ou não muda, dependendo da escolha dos falantes. No caso de ato (acto, em Portugal), porém, a única grafia correcta no Brasil é ato, pois «não se escrevem as consoantes que se não proferem».

Pergunta:

Gostaria de saber qual é a tradução correcta para a palavra inglesa stactometer. Segundo certos dicionários, há duas palavras, conta-gotas e "estactómetro"; a primeira encontra-se muito, e a segunda é raríssima. São ambas correctas?

Obrigado.

Resposta:

Conta-gotas (a pipeta usada para libertar um líquido gota a gota) pode ser o termo adequado para traduzir stactometer, mas esta palavra também pode ser empregada, em inglês, como sinónimo de stagmometer ou stalagmometer, um instrumento utilizado para determinar o número exacto de gotas numa quantidade de líquido, bem como a tensão superficial dos fluidos. Nesse caso, deve usar-se, em português, o nome estalagmómetro.

Tudo depende, portanto, do contexto em que a palavra é utilizada.

Pergunta:

Na frase «Viveram dez anos», o sujeito pode ser classificado como indeterminado? «Eles»? Ou não posso dizer «eles», classificando-o apenas como indeterminado?

Resposta:

Na frase «Viveram dez anos», o sujeito não é indeterminado, mas antes subentendido, isto é, está implícito na flexão do verbo e pode, em princípio, ser identificado num enunciado anterior àquele (e, em casos menos frequentes, num enunciado posterior).

Dado que o verbo está conjugado na 3.ª pessoa do plural, podemos inferir que corresponde ao pronome pessoal eles. No entanto, tudo depende do contexto: também pode corresponder a um sujeito feminino plural: elas. Assim, quando pretendemos identificar com exactidão o sujeito que está subentendido numa frase, devemos referir o nome (comum ou próprio) da pessoa ou entidade que desempenha a acção expressa pelo verbo.

Pergunta:

Encontrei a palavra "rangeabilidade" neste contexto:

«A rangeabilidade deste tipo de medidor normalmente situa-se entre 20:1 e 50:1 e sua acurácia é de ± 1%, podendo atingir valores muito menores da ordem de ± 0,25%.»

Gostava de conhecer a vossa opinião sobre o uso do termo, bem como de outros termos técnicos que têm sido introduzidos no português tais como "deletação" e "assemblagem".

Obrigado.

Resposta:

No meu entender, sendo esses termos traduções literais do inglês (e por vezes até neologismos em inglês, como rangeability), não devem ser empregados em português quando existem na nossa língua palavras adequadas para veicular esses conceitos. Por exemplo:

“assemblagem” — (de assemblage) reunião, junção, agrupamento

“acurácia” — (de accuracy) precisão

“deletação” — (de delete) eliminação, apagamento, destruição

“rangeabilidade” — (de range e “rangeability”) gama (de utilização de um aparelho)


Pergunta:

Na sequência da resposta à pergunta relativa à tradução do termo inglês "peer", pergunto se não se poderá usar "inter pares", conservando as aspas no texto, considerando-a uma expressão latina.

Antecipadamente agradeço o comentário.

Resposta:

Tratando-se de um prefixo, inter não deve ser usado autonomamente, mas antes ligado ao radical que modifica, com ou sem hífen, conforme o primeiro grafema desse radical.

No caso concreto da «avaliação entre pares», parece-me que será mais legítimo usar o neologismo “interpares” do que escrever separadamente «inter pares».

Existe, de facto, a locução latina «primus inter pares», mas o seu significado («o primeiro entre iguais») não se aplica aos casos em que se fala, por exemplo, da avaliação de funcionários por parte dos seus colegas (avaliação entre pares).