Sandra Duarte Tavares - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sandra Duarte Tavares
Sandra Duarte Tavares
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É mestre em Linguística Portuguesa pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. É professora no Instituto Superior de Comunicação Empresarial. É formadora do Centro de Formação da RTP e  participante em três rubricas de língua oortuguesa: Agora, o Português (RTP 1), Jogo da Língua  e Na Ponta da Língua (Antena 1). Assegura ainda uma coluna  mensal  na edição digital da revista Visão. Autora ou coa-autora dos livros Falar bem, Escrever melhor e 500 Erros mais Comuns da Língua Portuguesa e coautora dos livros Gramática Descomplicada, Pares Difíceis da Língua Portuguesa, Pontapés na Gramática, Assim é que é Falar!SOS da Língua PortuguesaQuem Tem Medo da Língua Portuguesa? Mais Pares Difíceis da Língua Portuguesa e de um manual escolar de Português: Ás das Letras 5. Mais informação aqui.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

As funções sintácticas que se seguem ao verbo nas frases «Resisto ao Paulo» e «Resisto ao frio» são complemento indirecto e complemento oblíquo?

Resposta:

Ambos os sintagmas preposicionais «ao Pedro» e «ao frio» desempenham a função sintática de complemento indireto.

O complemento indireto é sempre substituível pela forma dativa do pronome pessoal (-lhe) e, apesar de ser tipicamente um argumento [+ animado], pode incorporar o traço [- animado], com certos predicadores. Eis alguns exemplos:

a) «Este texto obedece ao novo Acordo Ortográfico.»

b) «Muita gente sobreviveu ao sismo.»

c) «Fiz uma limpeza geral à casa.»

d) «Resisti à tentação.»

Pergunta:

Sobre-investimento, ou sobreinvestimento? Como escrever? Não encontro em lado nenhum a resposta.

Resposta:

A grafia correta é: sobreinvestimento, sem hífen.

Conforme indicado na Base XVI, artigo 2.º, alínea b) do Acordo Ortográfico de 1990, não se emprega o hífen:

b) «Nas formações em que o prefixo ou pseudoprefixo termina em vogal e o segundo elemento começa por vogal diferente, prática esta em geral já adotada também para os termos técnicos e científicos. Assim: antiaéreo, coeducação, extraescolar, aeroespacial, autoestrada, autoaprendizagem, agroindustrial, hidroelétrico, plurianual

Pergunta:

Na frase «Hoje, ninguém foi trabalhar», gostaria de saber qual o tipo de sujeito de ninguém (simples, ou indeterminado?)

Resposta:

Trata-se de um sujeito simples, realizado através do pronome indefinido ninguém.

Semanticamente, este pronome tem uma interpretação genérica, mas, do ponto de vista sintático, ele está lexicalmente realizado, pelo que não pode ser considerado nulo. Eis alguns exemplos de sujeitos lexicalmente nulos:

– Sujeito nulo subentendido

«Vamos ao teatro?»

– Sujeito nulo indeterminado

«Dizem que os impostos vão aumentar.»

– Sujeito nulo expletivo (inexistente)

«Nevou na serra da Estrela.»

«Há vários computadores avariados.»

«Parece que vai chover hoje.»

Pergunta:

Numa aula de Língua Portuguesa, a professora classificou de predicativo do sujeito a palavra sol, na frase «Está sol». Logo de seguida, uma aluna perguntou qual era o sujeito da frase. No seu entender, a frase não teria sujeito, logo sol não poderia ser predicativo do sujeito.

Na sala dos professores, uma vez colocada a dúvida, ninguém soube dar uma resposta. Pergunto: como se resolve esta questão? A frase tem, ou não, sujeito? Se não tem, poderá sol ser o predicativo do sujeito?

Resposta:

A classificação está correta.

A palavra sol é, efetivamente, um predicativo do sujeito, ainda que predique um sujeito que é inexistente!

Trata-se do uso impessoal do verbo copulativo estar, à semelhança do que acontece com estruturas que contêm o verbo copulativo ser, usado impessoalmente:

(1) «É meia-noite.»

(2) «São cinco horas.»

(3) «Está frio!»

(4) «Está sol!»

O sujeito destas frases é nulo expletivo, pelo que os constituintes nominais que ocorrem à direita dos verbos ser/estar desempenham a função de predicativo do sujeito. A concordância verbal é feita, assim, com esses constituintes.

Pergunta:

Em «Havia dúvida de que o fato fosse verdadeiro», temos o verbo havia como intransitivo. Como podemos classificar a palavra dúvida? É um complemento de havia (havia o quê?), não é?

Resposta:

Sim, a função desempenhada pelo sintagma nominal «dúvida de que o fato fosse verdadeiro» é a de complemento direto do verbo. Observe-se a substituição desse constituinte pela forma acusativa do pronome pessoal:

  a) «Havia-a

  b) «Ainda há muitas dúvidas?» «Sim, tenho a certeza de que as há.»

Estamos perante o uso impessoal do verbo haver, pelo que o seu sujeito é inexistente (ou nulo expletivo).