Maria Eugénia Alves - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Maria Eugénia Alves
Maria Eugénia Alves
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Professora portuguesa, licenciada em Filologia Românica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, com tese de mestrado sobre Eugénio de Andrade, na Universidade de Toulouse; classificadora das provas de exame nacional de Português, no Ensino Secundário. 

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Segundo as regras de colocação pronominal, "diz-mo" deve estar certo. Podem confirmar isto? Contudo, as regras não parecem sugerir a forma "di-me-lo", que é a forma que eu sempre ouvi. Será que "di-me-lo" é um estrangeirismo do castelhano? É uma fórmula correta? Podem dizer-me qual das duas formas é correta e, se forem ambas, qual é a melhor? E porquê?

Muito obrigada.

Resposta:

      A forma correta é diz-mo e apenas esta.

      Quando ocorrem dois pronomes átonos, um complemento direto e outro indireto, podem combinar-se, seguindo a regra:

      • as formas de complemento indireto me, te, nos, vos, lhe e lhes combinam-se com as formas de complemento direto o, a, os, as. Assim, temos como exemplo:

mo = me+o, ma = me+a, mos = me+os, mas = me+as.¹

 

      Para concluir, di-me-lo não existe nem em português nem em castelhano, pois nesta língua escreve-se dímelo. 

¹ Nova Gramática do Português Contemporâneo, de Celso Cunha e Lindley Cintra, p. 309

Pergunta:

Na frase «A sogra bateu na nora porque estava bêbeda.», quem é que estava bêbeda, a sogra ou a nora?

Resposta:

       Aparentemente, gera-se uma ambiguidade, promovida pela ausência do sujeito na oração subordinada.

       Vejamos a frase:

      «A sogra bateu na nora porque estava bêbeda.» é constituída por duas orações, a subordinante, «A sogra bateu na nora», e a subordinada adverbial causal, «porque estava bêbeda».

     A oração causal apresenta a causa do acontecimento da oração subordinante. Segundo o Dicionário Terminológico, «exprime a razão, o motivo (a causa) do evento descrito na subordinante ou apresenta uma justificação para o que é expresso na subordinante». 

    Assim, parece-nos que o acontecimento da oração subordinante, a ação donde tudo decorre, determina o motivo da adverbial, significando que, no caso em apreço, por estar bêbeda, a sogra bateu na nora. O sujeito da oração subordinante mantém-se na subordinada, daí a permitida ausência nesta oração, onde está subentendido. Se fosse a nora que estava bêbeda, a frase teria de ser mais clara com a evidência de um sujeito diferente e expresso: «A sogra bateu na nora porque esta estava bêbeda.» 

        Por último, se invertermos a ordem canónica, fica mais fácil a compreensão da frase: «Como estava bêbeda, a sogra bateu na nora.» – pois o antecedente de sogra é ...

«<i>Tá-se </i> bem» – ou um verbo em vias de extinção

A propósito de um episódio  em que não era tasse, mas tá-se, que também não era tá-se mas está-se. E, ainda, um outro de um tive que devia ser um estive, mais o recorrente tropeção na precaridade.

 

 

Pergunta:

Gostaria que me esclarecessem uma dúvida: como se classificam as orações da frase «Cuida o patife que eu consentia que meu filho se ligasse a uma filha de Tadeu de Albuquerque!», do capítulo 6 da obra de Camilo Castelo Branco, Amor de Perdição?

Obrigada pela atenção.

Resposta:

A classificação das orações na frase «Cuida o patife que eu consentia que meu filho se ligasse a uma filha de Tadeu de Albuquerque!» é a seguinte: 

«Cuida o patife» – oração subordinante

«que eu consentia»  oração subordinada substantiva completiva

«que meu filho se ligasse a uma filha de Tadeu de Albuquerque!» – oração subordinada substantiva completiva

Pergunta:

Primeiramente, obrigada, equipa Ciberdúvidas, pelo excelente trabalho.

A pergunta que tenho é sobre o verbo calcorrear. Recentemente, li «os carros calcorreavam». Ora, se calcorrear significa «andar a pé» (Dicionário Priberam), «percorrer (caminho geralmente longo) a pé; caminhar muito» (Dicionário Infopédia), não se poderia aplicar o termo a veículos motorizados, certo?

Resposta:

De facto, calcorrear tem o significado de «percorrer a pé [...], andar muito a pé. Etimologicamente, provém do espanhol, calcorrear (1609) 'correr', derivado de calcorro, 'sapato' (Dicionário Houaiss).

O Dicionário Morais reitera a ideia de «andar a pé, percorrer longas distâncias a pé, caminhar».

No entanto, o termo pode eventualmente ser alargado, numa liberdade semântica e metafórica, de cariz literário. E, nesse caso, é perfeitamente admissível. Mas, como se desconhece o contexto, não poderemos dar uma resposta cabal à dúvida apresentada.

Os nossos agradecimentos pelas palavras para com o Ciberdúvidas.