Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
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Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Pedia que me elucidassem sobre a seguinte questão: a frase «Kant substituiu à razão estática uma razão dinâmica» é válida? Ou deverá ficar: «Kant substituiu a razão estática por uma razão dinâmica»?

Resposta:

A segunda frase apresentada — «Kant substituiu a razão estática por uma razão dinâmica» — é a correta.

Segundo o Dicionário Sintático de Verbos Portugueses (Coimbra, Almedina, 1994), de Wilfried Busse (coord.), a sintaxe do verbo substituir prevê duas situaçôes:

— N - V - N - (por N):

   «Não podemos retirar um disco para o substituir por outro

   «Tenho de substituir o pneu da bicicleta (por outro).»

   «O dono deste prédio substitui o velho porteiro (por outro).»

— N - V - N:

   «Os manuais escolares não substituem as explicações claras e concisas de que todo o programador necessita.»

   «Para alguns, o psicanalista substitui o confessor.»

Pergunta:

Gostaria de saber se a palavra palmeira é um substantivo epiceno.

Resposta:

A palavra palmeira (de palma + -eira) é um termo do domínio da botânica, o «nome vulgar comum a todas as plantas da família das Palmáceas, geralmente árvores, arbustos ou plantas com uma copa sem ramos mas dotada de folhas grandes com lacínias duras, flexíveis e pontiagudas» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2010).

Ora, a subclasse dos nomes/substantivos epicenos restringe-se «[aos] nomes de animais que possuem um só género gramatical para designar um ou outro sexo» (Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 196), de que são exemplo águia, sapo, corvo, hiena, crocodilo, hipopótamo, andorinha, e tantos outros.

Portanto, se designa uma planta, palmeira não pode ser um substantivo epiceno, sendo um nome comum feminino, pois, tal indica a regra, «são geralmente femininos os nomes terminados em -a átono» (Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 190).

Pergunta:

Por favor, gostaria de saber o aumentativo e o diminutivo da palavra centopeia.

Resposta:

Uma vez que não se encontram registadas nos dicionários (nem na bibliografia específica) outras formas do aumentativo e do diminutivo do substantivo/nome centopeia — que designa o animal «antrópode, da classe dos miriópodes com o corpo dividido em vinte e um segmentos, a cada um dos quais corresponde um par de patas», mas que é usado também com o sentido de «mulher alta, magra, feia e de aspeto repugnante» —, temos de recorrer às regras para a formação de tais graus.

Importa referir, antes de mais, que poderemos realizar o aumentativo e o diminutivo de duas  formas:

— analiticamente, «juntando-lhe um adjetivo que indique aumento [grande, enorme] ou diminuição [pequeno, minúsculo], ou aspetos relacionados com essas noções»:

aumentativo — «centopeia grande», «centopeia enorme»;

diminutivo — «centopeia pequena», «centopeia minúscula».

— sinteticamente, «mediante o emprego de sufixos especiais, na forma feminina, uma vez que é um nome feminino: aumentativos [-ão, -ona, -aça, -uça, arra, -orra,] e diminutivos [-inha, -zinha, -ina, -icha, -ita, -ucha, -eca, -ica]», do que podem resultar formas como:

diminutivo — centopeiazinha, centopeiinha, centopeiita

aumentativo — centopeiona, centopeiaça, centopeiarra.

Pergunta:

A minha dúvida é como se diz corretamente a expressão: «certeza que» ou «certeza de que».

Ex.: «Tenho a certeza que vamos...», ou «Tenho a certeza de que vamos...»?

Será que está dependente do verbo que vem a seguir?

Resposta:

A forma correta é «Tenho a certeza de que vamos...».

A dúvida da consulente deve-se ao facto de se verificarem muitos casos de supressão da preposição de que o nome/substantivo certeza impõe no argumento, tal como observaram João Peres e Telmo Móia em Áreas Críticas da Língua Portuguesa (Lisboa, Caminho, 1995, pp. 110-111): «O tipo de supressão de preposições argumentais [...] corresponde a um fenómeno bastante difundido – como bem demonstra a quantidade de casos recolhidos –, que muitos dicionários e gramáticas registam, que encontramos em muitos dos nossos autores e que parece ser aceite por grande parte dos falantes.»

No entanto, apesar de não considerarem que essa omissão torne tais estruturas agramaticais, os dois defendem o favorecimento da «norma da conservação da preposição nos casos em preço».

Segundo Peres e Móia, os nomes/substantivos certeza ou ideia e os adjetivos certo, seguro, indeciso e hesitante requerem a preposição argumental de.

Repare-se nos seguintes exemplos:

1. «Tenho a certeza de que o Paulo me vai ajudar.»

1.1. (?) «Tenho a certeza que o Paulo me vai ajudar.»

2. «Tenho a certeza de poder contar com a ajuda do Paulo.»

2.1. *«Tenho a certeza poder contar com a ajuda do Paulo.» (* – agramatical)

3. «Tenho a certeza de muitas coisas.»

3.1. *«Tenho a certeza muitas coisas.» (* – agramatical)

4. «Tenho a certeza...

Pergunta:

Alguns manuais do 7.º ano incluem, e com sentido, os verbos tornar-se e revelar-se como copulativos, deixando a indicação de que há mais.

Peço uma pequena lista de mais alguns verbos copulativos a acrescentar aos já conhecidos.

Resposta:

Inês Duarte, no capítulo 10 da Gramática da Língua Portuguesa (Lisboa, Caminho, 2003, p. 302), indica a seguinte lista exemplificativa de verbos copulativos – também denominados predicativos, de cópula ou de ligação: andar1, continuar1, estar, ficar, parecer, permanecer, revelar-se, ser, tornar-se.

O próprio Dicionário Terminológico, para exemplificar a definição de verbos copulativos, indica os verbos copulativos mais conhecidos: «Verbo que ocorre numa frase em que existe um constituinte com a função sintática de sujeito e outro com a função sintáctica de predicativo do sujeito. Exemplos: Costumam listar-se como verbos copulativos os seguintes: ser, estar, ficar, parecer (como em "parecer doente"), permanecer, continuar (como em "continuar calado"), tornar-se e revelar-se

1Os verbos andar e continuar nem sempre funcionam...