Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
Eunice Marta
52K

Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

«É uma mulher controladora cujos os objectivos de vida são muito limitados.»

A frase está correcta?

Resposta:

Não, a frase apresentada não está correta, porque não se coloca o artigo definido os (assim como qualquer outro artigo) após o pronome relativo cujo(s), que antecede sempre o nome/substantivo (que representa a coisa possuída), concordando com ele em género e em número.

Portanto, a frase correta terá a seguinte forma: «É uma mulher controladora cujos objectivos de vida são muito limitados.»

Repare-se que o pronome cujo, considerado por Cunha e Cintra como «relativo e possessivo», é «equivalente pelo sentido a do qual, de quem, de que» (Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2001, p. 350), razão pela qual é classificado por Ana Maria Brito e Inês Duarte, na Gramática da Língua Portuguesa (Lisboa, Caminho, 2003, p. 664) como um constituinte relativo que «marca o genitivo, ocorrendo no SN (sintagma nominal) em início de relativa [tendo] flexão de género e de número», assinalando que, além da sua construção «cujo + Nome [como em a)], em português, há mais duas construções que marcam o genitivo: de quem/ do qual ... o Nome [como em b)], e o Nome do qual [como em c)]:

a) Está ali o homem cujo nome perguntaste.

b) Está ali o homem de quem perguntaste o nome.

c) Está ali o homem o nome do qual perguntaste.» 

Pergunta:

Gostaria de saber, de acordo com o novo acordo ortográfico, se o acento nas formas verbais terminadas em -ámos no pretérito perfeito do indicativo é de uso facultativo (encontrámos/encontramos).

Resposta:

De facto, o ponto 4 da Base IX (Da acentuação gráfica das palavras paroxítonas) do Acordo Ortográfico de 90 determina a facultatividade do acento gráfico para esses casos — «É facultativo assinalar com acento agudo as formas verbais de pretérito perfeito do indicativo, do tipo amámos, louvámos, para as distinguir das correspondentes formas do presente do indicativo (amamos, louvamos), já que o timbre da vogal tónica/tônica é aberto naquele caso em certas variantes do português» —, o que legitima a grafia dessas formas verbais com ou sem o acento.

Assim, atualmente, são igualmente corretas as frases seguintes:

«Quando é que nos encontramos?» (presente do indicativo)

«Lembras-te de quando é que nos encontramos/encontrámos?» (pretérito perfeito).

Nota: Este é um dos casos de mudança previstos pelo Acordo Ortográfico de 1990 (Base IX), e isso deve-se à existência de variantes de timbre da vogal tónica.

Pergunta:

Como se diz: «Vivo em união de facto», ou «vivo maritalmente com» ?

Se for as duas, porquê?

Resposta:

A expressão «união de facto» [ou «união livre»] designa «relação entre duas pessoas que pressupõe convivência análoga à dos cônjuges, mas sem o vínculo do matrimónio» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2004 e 2010).

Por sua vez, o advérbio maritalmente equivale a «como um casal; como pessoas casadas» (idem).

Portanto, embora nos pareça mais correto o uso da forma «viver em união de facto» — porque, como já foi aqui dito, é essa a forma prevista na legislação [«Na Lei n.º 7/2001, de 11 de Maio, que recentemente reforçou as medidas de protecção às uniões de facto, as expressões usadas são «pessoas que vivem em união de facto» e «membro da união de facto»] —, se se trata de uma situação em que duas pessoas vivem «como um casal», significado atestado pelo dicionário, não há razão para se dizer que é incorreta a forma «viver maritalmente» referente a casos de «união de facto».

Pergunta:

«Assegurei à minha irmã "de que" regressaria o mais depressa possível.»

Esta frase está correcta?

Resposta:

A forma correta dessa frase não prevê a ocorrência da preposição de — «Assegurei à minha irmã que regressaria o mais depressa possível» —, porque se trata de um caso em que o verbo assegurar é usado numa estrutura com o valor de «assegurar a alguém alguma coisa», ou seja, selecionando um complemento indireto [«à minha irmã»] e um complemento direto [«que regressaria o mais depressa possível», uma subordinada completiva].

Se se tratasse de uma frase em que esse verbo fosse usado numa construção com o sentido de «assegurar alguém de alguma coisa», em que selecionasse um complemento direto [alguém] e um complemento preposicional [de alguma coisa], implicaria o uso da preposição de. Por exemplo:

«Asseguro-o de que faço isso.»

Pergunta:

«Gosto de trepar nas árvores», ou «Gosto de trepar às árvores»?

Resposta:

Ambas as formas — «Gosto de trepar nas árvores» e ««Gosto de trepar às árvores» — são possíveis e corretas, assim com ainda outras:

 

«Gosto de trepar árvores.»

«Gosto de trepar pelas árvores.»

«Gosto de trepar para as árvores.»1

O verbo trepar, com o valor de «subir (a), agarrando com as mãos e firmando-se com os pés», admite várias construções:

— como verbo transitivo direto, sem preposição [Grupo nominal (sujeito) + Verbo + Gr. Nom. (complemento direto)]. Exemplos:

 

«Ele trepou a/uma árvore.»

«O gafanhoto trepava a ávore.»

— como transitivo indireto, com preposição – a, em, para, por [GNl (sujeito) + Verbo + Grupo preposicional (a, em, para, por)]. Exemplos:

 

«Ele trepou ao cimo da montanha.»

«O amigo trepou ao escadote para apanhar fruta.»

«O moleque trepa nas árvores como um macaco.»

«Eu vi Zezé trepando na laranjeira.»

«A planta trepava para o exterior.»

«Ela trepou por uma árvore muito alta.»

«A luz trepava pela parede.»

Fontes: Dicionário Gramatical dos Verbos Portugueses, da Texto Editores, 2007; Dicionário Prático de Regência Verbal (São Paulo, Ática, 2003), de Celso Luft; Dicioná...