Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
Eunice Marta
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Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Recentemente deparei-me com uma dúvida. O número 14 escreve-se quatorze, ou catorze?

Resposta:

O Vocabulário Ortográfico do Português, do ILTEC, regista a forma catorze, assinalando a variante quatorze (Brasil).

Por sua vez, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Porto Editora, atesta as duas formas: catorze e quatorze, sem qualquer indicação de que se trataria de variantes do português europeu e/ou do Brasil.

Por seu lado, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras, contempla, também, as duas formas: catorze e quatorze.

Portanto, como não há qualquer indicação contrária no Acordo Ortográfico de 1990, as duas grafias estão corretas. No entanto, em Portugal prefere-se tradicionalmente catorze, e no Brasil o uso favorece a mesma grafia, conforme comenta Maria H...

Pergunta:

«Preciso de te dizer a verdade.»

Como se faz a divisão e classificação destas orações?

Resposta:

Como o verbo precisar é um dos verbos [tal como gostar e necessitar] que selecionam completivas não finitas precedidas pela preposição de» (Mira mateus et alii, Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Caminho, 2003, p. 636), a divisão e a classificação das orações da frase «Preciso de te dizer a verdade» é a seguinte:

«Preciso» — oração subordinante

«de te dizer a verdade» — oração subordina completiva de infinitivo (ou não finita)

Nota: Os verbos como gostar, necessitar e precisar «selecionam [também] completivas finitas não preposicionadas» (idem). Exemplos:

«O João gosta [que a Maria toque flauta].»

«O João precisa [que lhe dêem uma boa lição].»

«Ela necessita [que lhe façam esse trabalho].»

Pergunta:

Quando uma frase termina com uma abreviatura, deve escrever-se com dois pontos no final, ou apenas um?

Exemplo: «A resposta será comunicada em breve a V. Exas..»

Resposta:

«A resposta será comunicada em breve a V. Exas.» é a forma correta, terminando a frase com o ponto da abreviatura, conforme nos alertam os gramáticos Cunha e Cintra, na sua Gramática do Português Contemporâneo (Lisboa, Sá da Costa, 2001).

Como o ponto, para «além de servir para marcar uma pausa longa», é o sinal que se emprega depois de qualquer abreviatura [V. S.ª (Vossa Senhoria), V. Ex.as ou V. Exas. (Vossas Excelências)], «se a palavra assim reduzida estiver no fim do período, este encerra-se com o ponto abreviativo, pois não se coloca outro ponto depois dele» (idem, p. 647).

No entanto, a situação é diferente, se a frase terminar com qualquer outro sinal de pontuação. Por exemplo, é frequente ver-se o uso de dois-pontos após a abreviatura de exemplo [ex.:].

Nota: Tal como já foi aqui dito, nas abreviaturas «podem-se usar também as últimas letras, em expoente (ex.: Manuel: M.el ) ou não (ex.: Senhora: Sra.)». Por isso, poder-se-á usar as duas formas abreviadas para Vossa Excelência: V. Ex.ª ou V. Exa.

Pergunta:

Qual é a forma correcta (ou se são ambas correctas): «Quando eu possa...», ou «Quando eu puder...»?

Resposta:

A forma correta é «Quando eu puder», como o verbo no futuro (simples) do conjuntivo, marcando «a eventualidade no futuro».

Repare-se que o futuro do conjuntivo simples se «emprega em orações subordinadas adverbiais (condicionais, conformativas e temporais), cuja principal vem enunciada no futuro ou no presente» (Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2001, p. 473), como se pode verificar pelos seguintes exemplos:

«Quando puder, passarei por aqui.»

«Quando puder, venha ver-me.»

«Se quiser, irei vê-lo.»

«Se quiser vê-lo, vá a sua casa.»

«Farei conforme mandares

«Faça como souber

Nota: O modo conjuntivo (no presente e/ou no futuro) é de regra nas orações subordinadas temporais introduzidas pelas locuções assim que, logo que, sempre que, todas as vezes que, indicando um facto no futuro. Exemplos:

«Assim que possa/puder, vou ver essa exposição.»

«Dou-te uma resposta logo que possa/puder.»

«Estarei contigo sempre que possa/puder

«Venho participar nesses encontros todas as vezes que possa/puder

Pergunta:

A expressão «andar em bicos dos pés»: é «bicos dos pés», «bicos de pés», «bicos de pé» ou alguma das anteriores com hífen?

Resposta:

O Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa (2001), regista as duas formas (sem hífen) — «em/nos bicos dos pés» [assim como o Dicionário Estrutural Estilístico e Sintáctico da Língua Portuguesa (Porto, Lello & Irmão), de Énio Ramalho] e «em bicos de pés» —, significando «sem assentar os calcanhares no chão, apoiando-se nos dedos, na ponta do pé», «sem ruído, sem que se ouçam os passos». Exemplos:

 

«Aproxima-se cautelosamente, em bicos dos pés.»

«Dos 3 aos 4 anos [a criança] passeia sozinha, é capaz de andar em bicos dos pés, aprende a vestir-se e a despir-se sozinha.»

 «As criadas entravam e saíam do quarto da senhora nos bicos dos pés, ajoujadas com panelas de água quente» (Júlio Dantas, Amor em Portugal, p. 198).

«Os bebés podem andar em bicos de pés quando começam a andar e, depois, começam gradualmente a andar com os pés bem assentes no chão.»

«"Andar em bicos de pés" é especialmente comum quando os bebés aprendem a caminhar com apoios (deslocam-se numa sala usando os móveis como apoio) durante os primeiros meses de caminhada, especialmente num chão sem alcatifa.»

 

No entanto, quando inseridas nas expressões «pôr-se em/nos bicos dos pés» e «pôr-se em bicos de pés», as duas formas conferem sentidos diferentes aos enunciados. Segundo o dicionário da Academia das Ciências e o de Énio Ramalho (obras citadas), «pôr-se em/nos bicos dos pés» é usada para designar «elevar-se, sustentando-se nos dedos dos pés». Exemplos:

«Por ser muito baixo, ele teve de se pôr nos bicos dos pés para conseguir...