Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Numa altura em que se fala muito do PEC, gostaria de esclarecer qual o significado desta sigla: "Pacto/Programa/Plano de Estabilidade e Crescimento"? Ou pode assumir mais do que um significado?

Resposta:

Pelo Portal do Governo, conclui-se que, neste momento Março de 2010), PEC é o acrónimo da expressão Programa de Estabilidade de Crescimento.1

1 A forma é pronunciada como uma palavra com duas sílabas: "peque". Se a forma fosse soletrada, falaríamos de sigla (ver textos Relacionados).

Pergunta:

Agradecia o favor de me esclarecerem o seguinte:

Qual a fonética de RENRede Eléctrica Nacional?

Conforme as regras ancestrais não deturpadas da gramática portuguesa: "rên"?

Ou de acordo com o modernismo devastador, macarrónico: "rène"?

Se possível, grato ficaria ainda que me informassem tomando apenas como base a gramática e as regras portuguesas, deixando de lado eventuais considerações fundamentadas nas normas gramaticais ou outras brasileiras.

Resposta:

Tradicionalmente, e abrangendo a língua portuguesa globalmente, pronuncia-se a sequência de vogal e consoante nasal como vogal nasal em acrónimos constituídos por monossílabos ou sílaba tónica final: OTAN = "otã". Sendo assim, REN = "rẽ" (com e nasal, como em entre).

No entanto, é verdade que ocorre "réne", porque, noutros acrónimos, a sequência "-en", fazendo parte de um monossílabo, se lê "éne". Por exemplo, quando se fala do PEN Clube1, a pronúncia generalizada é a que corresponde a "péne" e não a "pen". Tal pronúncia pode considerar-se menos genuína, mas encontra-se em posição átona em palavras como abdómen ("abdómene") glúten ("glútene") ou pólen ("pólene"), todas com e aberto nas sílabas -men, -ten e -len, respectivamente.

1 PEN é realmente a sigla de «poets, essayists and novelists» («poetas, ensaístas e romancistas»).

Pergunta:

O diminutivo de baú é "bauzinho" ou "baúzinho"? A dúvida surgiu porque ambas as hipóteses apareceram em textos de manuais.

Resposta:

Actualmente, forma "baúzinho" é impossível, porque o diminutivo de baú é uma palavra grave, cuja sílaba tónica é -zi-. Não tem, portanto, sentido nenhum manter o acento gráfico. Quanto ao facto de ocorrer em manuais, se estes são recentes, só pode tratar-se de erro. Mas convém sempre ter em conta a data de publicação: é que antes de 1973, em Portugal, os diminutivos transformavam em acento grave o acento agudo da então chamada palavra primitiva: baú > baùzinho. Isto acontecia devido ao preceito enunciado na Base XXIII do Acordo Ortográfico de 1945:

«Escrevem-se com acento grave, na parte anterior ao sufixo, os advérbios em mente que provêm de formas marcadas com acento agudo: benèficamente, contìguamente, diàriamente; agradàvelmente, distraìdamente, genuìnamente, heròicamente, miùdamente; màmente, sòmente.

Do mesmo modo, escrevem-se com acento grave, na parte anterior à terminação, os derivados em que entram sufixos precedidos do infixo z e cujas formas básicas são também marcadas com acento agudo: chàvenazinha, làbiozinho, nòdoazita; bòiazinha, faùlhazita, màrtirzinho, òrfãzinha, rèpteizitos; anèizinhos, avòzinha, cafèzeiro, chapèuzinho, chàzada, heròizinho, màzona, pèzito, pèzorro, pèzudo, santa-fèzal, sòzinho, vintènzito

O caso de baùzinho era assim semelhante ao de faùlhazita.

Pergunta:

Procuro um dicionário online de antónimos, pois uso bastante esse recurso. Gostaria de ter o antónimo de empatia.

Resposta:

Após muita pesquisa, não encontro nenhum dicionário de antónimos de acesso em linha. Na verdade, o mais que existe são numerosas páginas de publicidade a dicionários em edição impressa ou em formato electrónico.

Quanto aos antónimos correspondentes a empatia, eu diria que, entre os possíveis, se contam repulsa e repulsão (cf. Dicionário Houaiss)1 ou locuções como «ausência de empatia» ou empatia negativa («sentimento que produz um mal-estar e desencontro psíquicos entre duas ou mais pessoas, podendo existir, por vezes, uma sentimento de repulsa», Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa).

1 Entre os antónimos mencionados no verbete de empatia, o Dicionário Houaiss acolhe simpatia, o que me parece estranho, porque não se trata de termos contrários, apesar da sua diferença semântica. Mais sentido faz a remissão para o verbete de repulsão, cujos sinónimos são, a saber: abominação, antipatia, asca, asco, aversão, desamor, desgosto, desprezo, dificuldade, enjeitamento, enjoo,

Pergunta:

Será que me podem ajudar no seguinte:

Em muitos documentos (extensos) sobre a actividade de uma determinada organização (empresa, escola, associação etc.) recorre-se ao uso do sujeito tanto na terceira pessoa do singular como na primeira pessoa do plural porque permite uma maior flexibilidade na apresentação dos conteúdos e porque diminui-se o número de vezes que se utiliza o nome da entidade. Dou um exemplo:

«Financeiramente, a EDP reforçou a sua posição. A EDP encaixou mais de mil milhões de euros na alienação de activos não estratégicos, 25% acima do compromisso inicial. Demonstrámos a nossa credibilidade no mercado, sobretudo no contexto de um mercado mais difícil (...)»

Gostaria de saber se é correcta esta utilização "dual" do sujeito. Eu tenho desenvolvido textos deste modo, considerando que não estava a cometer nenhuma incorrecção.

Muito obrigada pela vossa atenção.

Resposta:

Recomenda-se que o sujeito do discurso seja coerente, devendo evitar-se a mistura de pronomes e de formas flexionadas de diferentes pessoas (ver Edite Estrela et al., Saber Escrever Uma Tese e Outros Textos, Lisboa: Edições Dom Quixote, págs. 43/44). Contudo, no caso vertente, é aceitável a alternância proposta entre a terceira pessoa do singular, quando se refere a entidade empresa, e a primeira pessoa do singular, para remeter ao conjunto de pessoas que nela trabalham. Do ponto de vista comercial, é até uma estratégia de tornar mais pessoal e humana a projecção da empresa junto dos seus clientes ou utentes.