Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

A propósito da comemoração, em 2009, da chegada do homem à Lua, aconteceu interrogar-me sobre o porquê da diferença de designação: astronauta para os americanos (e ocidente em geral) e cosmonauta para os soviéticos (e para os russos, agora)?

Procurei na Internet, e todos parecem aceitar que quando se fala de russos deve dizer-se "cosmonautas" e que para americanos o termo certo é "astronautas", sem, contudo, em nenhum dos sítios-web que consultei, alguém avançar com qualquer explicação sobre esta diferença de designação.

Então ocorreu-me formular algo que está longe de ser uma teoria, é mais um palpite!

Quando se fala do Vietname, por exemplo, deve dizer-se que fica no Sudeste asiático (localização em relação ao próprio continente asiático) e não que fica no extremo-oriente (nomenclatura eurocentrista).

Será que uma dicotomia semelhante se aplica às designações cosmonauta — que poria a tónica no cosmos infinito, ele próprio, e não na visão que se tem dos astros a partir da Terra (e dos seus interesses...), enquanto astronauta seria, portanto, muito mais "terrocentrista"?

Diferenças semânticas que têm por trás diferentes mundivisões? Por favor, esclareçam-me.

Antecipadamente grato.

Resposta:

A explicação do consulente é realmente um palpite difícil de confirmar. Mas não vejo "terrocentrismo" (para usar o neologismo) em astronauta, porque astro designa qualquer corpo celeste, com e sem luz própria, incluindo a Terra; o mais que me parece poder dizer-se é que cosmos, enquanto «espaço universal, composto de matéria e energia e ordenado segundo suas próprias leis» (Dicionário Houaiss), denota um todo, enquanto astro, uma perspectiva atomista, por referir elementos desse todo.

Diga-se que, segundo o Online Etymology Dictionary, astronaut está atestado em inglês desde 1929 e terá sido criado por sugestão do francês astronautique, termo criado por J. H. Rosny, pseudónimo do belga Joseph Henri Honoré Boex (1856–1940). Cosmonaut também está registado em inglês (ver Oxford Advanced Dictionary, Merriam Webster Dictionary), embora em data mais recente (1959), como empréstimo do russo kosmonavt, língua em se criou o termo a partir de radicais gregos: kosmos (= «cosmos») + nautes (= «navegante»); Online Etymology Dictionary.

Pergunta:

Vivo numa vila do concelho de Tondela, distrito de Viseu, chamada Lajeosa do Dão.

Gostaria de saber a proveniência do nome Lajeosa e se se escreve com um j, com um g, ou pode ser com os dois ("Lageosa").

Obrigado.

Resposta:

Escreve-se com j, porque o topónimo tem origem no adjectivo lajeoso (José Pedro Machado, Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa), derivado de laje. Lajeosa é também a forma indicada por Rebelo Gonçalves, no Tratado de Ortografia da Língua Portuguesa, quando afirma que a grafia de laje «[...] pede que se escreva lajem, lajear, lajedo, Laje, Lajes, Lajens, Lajeosa, etc.» (pág. 30, n. 5)

Pergunta:

Gostava de saber como é que se chama ao povo do estado de Nevada, nos Estados Unidos da América, se é que há um tal nome para designar esse povo norte-americano, tal como chamamos texanos ao povo do estado do Texas e nova-iorquinos ao povo da cidade de Nova Iorque.

É que estou a traduzir algo e de repente deparei-me com esta dúvida.

Muito obrigada pela vossa preciosa ajuda.

Resposta:

Em princípio, será nevadense, mas trata-se de forma não atestada nem em dicionários nem noutra fonte. O que ocorre frequentemente são expressões como «habitantes de Nevada», «a população de Nevada».

Em Portugal, Nevada pode ocorrer sem artigo («Universidade de Nevada»), mas tende a ser usado com artigo definido («o deserto do Nevada»), seguindo o exemplo de outros estados norte-americanos («o Massachusetts», «o Connecticut», «o Ilinóis», «o Alasca», «a Florida», «a Califórnia»). Mas há excepções, como sejam o «estado de Washington», sem artigo, certamente por se tratar de nome com origem num antropónimo (George Washington), ou o «estado de Nova Iorque», porque a designação tem origem no topónimo Nova Iorque, usado sem artigo.

Pergunta:

Tenho dúvidas que não consegui resolver em livros que tenho. São elas:

1— Qual o adjetivo pátrio referente à cidade de Miravânia?

2— Qual o plural das palavras plano de aula e roteiro de aula?

Desde já agradeço!

Resposta:

Não encontro forma dicionarizada ou registada noutra fonte, mas é possível formar o gentílico de acordo por analogia com outros terminados em -ense: miravaniense, tal como goianiense (de Goiânia).

Quanto aos plurais em apreço, são eles planos de aula e roteiros de aula.

Pergunta:

"Media" e "meios de comunicação" têm o mesmo significado? Será um dos termos mais (ou menos) abrangente do que o outro?

Resposta:

Os termos mídia (Brasil) ou media (Portugal) são sinónimos de «meios de comunicação». No entanto, se por «meios de comunicação» se entende «meios de comunicação social», então deve reconhecer-se que media tem uma significação mais vasta, como se verifica por uma das definições da palavra do Dicionário Houaiss:

«[mídia] todo suporte de difusão da informação que constitui um meio intermediário de expressão capaz de transmitir mensagens; meios de comunicação social de massas não diretamente interpessoais (como p. ex. as conversas, diálogos públicos e privados) [Abrangem esses meios o rádio, o cinema, a televisão, a escrita impressa (ou manuscrita, no passado) em livros, revistas, boletins, jornais, o computador, o videocassete, os satélites de comunicações e, de um modo geral, os meios eletrônicos e telemáticos de comunicação em que se incluem tb. as diversas telefonias.]»

Recomenda-se que media  se escreva em itálico ou entre aspas, porque, sendo vocábulo não português — em última análise, proveniente do latim —, deve ser tratado como palavra estrangeira. Sobre a etimologia de media, observe-se que, na realidade, o termo é uma criação da língua inglesa com base no latim, conforme se anota no Dicionário Houaiss (s.v. mídia): medius, a, um «meio; instrumento mediador, elemento intermédio» > media (neutro plural, usado em...