Carla Marques - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carla Marques
Carla Marques
138K

Doutorada em Língua Portuguesa (com uma dissertação na área do  estudo do texto argumentativo oral); investigadora do CELGA-ILTEC (grupo de trabalho "Discurso Académico e Práticas Discursivas"); autora de manuais escolares e de gramáticas escolares; formadora de professores; professora do ensino básico e secundário. Consultora permanente do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacada para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

A conjunção e pode ser repetida numa frase? Em que casos?

Obrigado.

Resposta:

A repetição da conjunção e numa mesma frase é possível, não constitui erro e pode ficar a dever-se a intenções de natureza estilística.

A conjunção coordenativa e é utilizada para coordenar vários tipos de constituintes, como por exemplo:

(i) grupos nominais: «O João e o Pedro foram ao cinema.»

(ii) grupos adjetivais: «O livro é interessante e completo.»

(iii) orações: «O João saiu agora e o Rui está a descansar.»

Na coordenação simples de dois ou mais termos, a conjunção copulativa surge antes do último termo coordenado:

(1) «Ele chegou a casa, sentou-se no sofá e descansou um pouco.»

Este processo designa-se coordenação sindética e corresponde a uma coordenação neutra do ponto de vista estilístico.

É possível também marcar todos os termos coordenados:

(2) «Ele chegou a casa e sentou-se no sofá e descansou um pouco.»

Este tipo de coordenação designa-se tradicionalmente polissindética e é estilisticamente marcada. O objetivo da reiteração da conjunção só poderá ser determinado em cada contexto específico, não obstante, de uma forma geral, a construção polissindética dá ênfase a cada um dos termos da coordenação, sublinhando uma intenção particular. Por exemplo, na frase (3), a construção destaca cada um dos elementos coordenados para colocar a tónica na energia do sujeito:

(3) «A Joan...

Pergunta:

Na frase «Teve vida breve e misteriosa o maior artista de sempre da Roma barroca», qual a função sintática de «breve e misteriosa»?

O constituinte responde ao teste «Teve-a breve e misteriosa», parecendo um predicativo do complemento direto.

Será esta a análise correta? Ou a análise que considera «vida breve e misteriosa» como complemento direto e «breve e misteriosa» como modificador do nome restritivo é que está correta?

Muito obrigada pela vossa ajuda.

Resposta:

Com efeito, na frase em apreço, o constituinte «breve e misteriosa» desempenha a função sintática de predicativo do complemento direto.

A comprovar esta análise estão os seguintes factos:

(i) o verbo ter pode ter funcionamento transitivo-predicativo, ou seja, selecionar, em simultâneo, um complemento direto e um predicativo do complemento direto, como se observa em (1):

(1) «Tenho as mãos frias.»

Sendo transitivo-predicativo, o verbo ter pode significar, por exemplo (cf. Dicionário Houaiss):

a) “contar com”: «Ter a morte (como) certa.»

b) “caracterizar-se por ou apresentar em si”: «Teve a vida breve e misteriosa.»

c) “fazer determinado julgamento sobre outrem”: «Tinha o João por entendido.»

(ii) o predicativo do complemento direto incide sobre o complemento direto, mas, em caso de substituição por pronome deste complemento, não é afetado:

Pergunta:

Li no manual do meu filho (Areal) que o modificador faz parte do predicado. Achei curioso e até caricato, já que é um grupo móvel.

Resposta:

modificador (do grupo verbal) integra a função sintática de predicado.

O predicado é uma função sintática que se define ao nível da frase e que pode incluir no seu interior o verbo e todos os seus complementos e modificadores.

Deste modo, o predicado pode resumir-se em exclusivo à forma verbal, num caso de um verbo intransitivo, por exemplo:

(1) «Ele tossiu.»

Em (1), o predicado é composto por tossiu.

Noutras frases, o predicado pode incluir um conjunto alargado de constituintes:

(2) «Ele escreveu imediatamente uma carta à Joana naquela tarde cheia de sobressaltos.»

Em (2), o predicado é compost...

Pergunta:

Na frase «O João disse onde estava escondido», a oração «onde estava escondido» pode classificar-se como substantiva relativa, mesmo tendo a função de completar a frase neste contexto?

Obrigada.

Resposta:

Se considerarmos que a frase apresentada integra uma interrogativa indireta, a oração «onde estava escondido» poderá ser considerada uma subordinada substantiva completiva interrogativa indireta.

As orações subordinadas substantivas completivas interrogativas indiretas parciais (ou seja, as que não têm como resposta sim ou não) caracterizam-se por serem introduzidas por uma palavra interrogativa, que poderá ser um pronome, um determinante, um quantificador ou um advérbio e por expressarem desconhecimento acerca desse constituinte interrogativo introdutório1:

(1) «Ele perguntou quem tinha chegado.»

A oração interrogativa indireta é introduzida pelo pronome interrogativo quem e questiona o valor específico de quem. Acresce que é possível estabelecer uma correspondência com a frase interrogativa direta que foi incluída na frase complexa:

(2) «Quem chegou/ tinha chegado?»

As orações interrogativas indiretas são, habitualmente, introduzidas por verbos de inquirição como averiguar, inquirir ou perguntar2. Não obstante, em situações específicas, poderão também ser introduzidas por verbos de conhecimento ou desconhecimento, ou seja, por verbos que indicam uma atitude de conhecimento:

(3) «P...

Falar em público
10 regras fundamentais para uma apresentação oral

Uma apresentação oral de sucesso não é fruto do improviso nem do acaso. A professora Carla Marques, consultora permanente do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, identifica e descreve 10 aspetos fundamentais para falar em público num texto publicado nas páginas eletrónicas da Leya Educação.

Na imagem, Cícero denuncia Catalina (1888), do pinto italiano Cesare Maccari (1940-1919).