Pergunta:
Primeiramente eu agradeço e parabenizo todos deste excelente e grandioso sítio, que é o Ciberdúvidas da Língua Portuguesa.
Trecho de uma carta de Monteiro Lobato (1882-1948) a Godofredo Rangel (1884-1951), em Barca de Gleyre:
«Apontas-me, como crime, a minha mistura de você com tu na mesma carta e às vezes no mesmo período. Bem sei que a Gramática sofre com isso, a coitadinha; mas me é muito mais cômodo, mais lépido, mais saído - e, portanto, sebo para coitadinha. Não fiscalizo gramaticalmente as frases em cartas. Língua de carta é língua em mangas de camisa e pé-no-chão, como a falada. Continuarei a misturar tu com você como sempre fiz... [...]»
1 - Os termos «como crime» e «como a falada» são classificados como aposto?
2 - No caso de o aposto ser formado por uma oração ou período todos, deve ser classificado somente como aposto? Ou deve ser analisado como uma oração ou período independente? Não achei na gramática tal explicação.
Agradeço-vos as respostas.
Resposta:
Os constituintes destacados pelo consulente têm naturezas distintas.
Assim, «como crime» desempenha na frase em que se insere a função de predicativo do complemento direto. O verbo apontar é um verbo transitivo-predicativo que seleciona, portanto, um complemento direto e um predicativo desse complemento direto, tal como acontece na frase (1), construída com o verbo transitivo-predicativo considerar:
(1) «Eles consideram o João simpático.» (complemento direto: «o João»; predicativo do complemento direto: «simpático»)
No caso do verbo apontar, este tem a especificidade de reger a preposição como, que introduz o predicativo do complemento direto.
Já o constituinte «como a falada» é uma oração subordinada comparativa com o verbo elidido, que corresponde à frase completa apresentada em (2):
(2) «Língua de carta é língua em mangas de camisa e pé-no-chão, como a falada é.»
Em nome do Ciberdúvidas, agradeço as gentis palavras que nos dirige.