Pergunta:
Gostaria de saber se a vírgula é sempre obrigatória nos casos em que se pretende subentender o verbo, ou se, quando o resultado é dúbio, se pode prescindir dela. Por exemplo:
«Odeio algumas pessoas, como tu, racistas.»
O que se quer dizer é que X odeia algumas pessoas da mesma forma que Y odeia racistas. Mas, com a vírgula a subentender o verbo «odiar» não poderá a frase passar a ideia de que X odeia algumas pessoas, como por exemplo a pessoa Y e racistas?
Poderia ser correcto, neste caso, grafar a frase assim: «Odeio algumas pessoas, como tu racistas»?
Obrigado.
O consulente escreve de de acordo com a norma ortográfica de 1945.
Resposta:
A frase apresentada é dúbia, pelo que só o contexto poderia ajudar a uma interpretação.
Não obstante, poderemos dizer que, de uma forma geral, uma oração comparativa não exige uma vírgula a separá-la da oração subordinante, ainda que possa ter um elemento elidido, como se exemplifica em (1)
(1) «Ele fala como a Ana (fala).»
A frase tal como se apresenta (e sem outro contexto) induz uma das seguintes leituras:
(i)
(2) «Odeio pessoas racistas como tu odeias pessoas racistas.»
A colocação das vírgulas, que isolam o constituinte «como tu», pode ir esta leitura, uma vez que sugerem que este é um constituinte deslocado da sua posição natural, que intercala o primeiro termo de comparação, separando o adjetivo racistas do nome que modifica (pessoas).
(ii)
(3) «Odeio pessoas (,) como tu, que são racistas.»
A intenção do locutor poderá ser a de acusar o interlocutor de ser racista.
(iii)
(4) «Odeio algumas pessoas tal como tu odeias alguns racistas.»1
Esta leitura parece ser, todavia, menos natural. Só o contexto a poderá forçar.
Por fim, a solução para evitar todos os equívocos e leituras dúbias que a frase pode gerar passará, eventualmente, pelo recurso a apenas uma vírgula a separar os dois termos da comparação (de modo a barrar a leitura prevista em (3)):
(5) «Odeio algumas pessoas, como tu racistas.»
Na oralidade, a entoação poderia contribuir para desfazer os equívocos que a frase poderá gerar.
Disponha sempre!