« (...) Estamos, pois, todos de parabéns: os que herdámos a língua portuguesa, os que a escolhemos como língua identitária e aqueles que a falamos por todo o mundo.»
Há dez anos que 5 de maio é o Dia da Língua Portuguesa e da Cultura. Instituído em 2009 pela CPLP, este dia celebra a importância da língua portuguesa como património cultural comum e a diversidade linguística e cultural dos seus Estados-membros (EM). Importa refletir sobre as mudanças ocorridas na gestão da língua portuguesa ao longo desta década.
O Dia foi celebrado pela primeira vez em 2010, semanas após a aprovação, pelos EM da CPLP, do Plano de Ação para a Promoção, a Difusão e a Projeção da Língua Portuguesa, documento essencial para o desenho da atual política linguística do português.
O Plano de Ação de Brasília inaugurou uma era de concertação internacional quanto às grandes opções e ações a empreender no que respeita à língua portuguesa. O PAB encetou também a prática de, com regularidade, se produzirem planos de ação comuns.
O seu ponto relativo ao Estado de desenvolvimento do Acordo Ortográfico foi provavelmente o que teve maiores consequências na mudança de paradigma de pensamento relativamente à língua comum. Nele lê-se: «É recomendável que os Estados-membros que ainda não possuem Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa desenvolvam a sua elaboração, edição e distribuição, de modo que se produza, posteriormente, em formato eletrónico, sob coordenação do IILP [...], o Vocabulário Ortográfico Comum da Língua Portuguesa [VOC], que consolide tanto o léxico comum quanto as especificidades de cada país".
Em consequência, o Instituto Internacional da Língua Portuguesa [IILP] aprovou uma proposta de configuração, estrutura e realização do VOC com base em um conjunto de opções técnicas e tecnológicas comuns quanto ao modelo de representação das palavras, assegurando a compatibilidade entre a contenção de custos, o trabalho de diferentes países e uma componente política a cargo de cada um deles. Em suma, cada país é responsável último pela decisão de quais as palavras representativas do “seu” português.
O VOC foi assumido como instrumento da CPLP em Díli (2014) e apresentado e disponibilizado online em 2017. Contém os vocabulários nacionais de Brasil, Cabo Verde, Moçambique, Portugal e Timor-Leste, e está apto a acolher os vocabulários dos restantes.
Se pelos seus aspetos técnicos, o VOC constitui um marco para a lexicografia computacional e da língua portuguesa, é ao nível político que o seu impacto foi mais significativo. Por um lado, configurou um novo entendimento político do português como língua pluricêntrica, com diversas normas nacionais, umas consolidadas (Brasil e Portugal), outras emergentes; por outro, inaugurou uma prática de gestão internacional da língua portuguesa, da sua política e recursos, partilhada em igualdade de circunstâncias por todos os EM da CPLP sob coordenação do IILP, que tem assim, apesar das suas grandes dificuldades, reforçado o seu estatuto e granjeado reconhecimento no seio da CPLP e a nível internacional.
A instituição do Dia da Língua Portuguesa e da Cultura na CPLP em 2009 constituiu um sinal claro da relevância crescente que a língua ganhou para os governantes da CPLP. A década que passou abriu caminho a uma gestão conjunta da língua portuguesa. A cada novo 5 de maio, importa continuar a celebrar a vontade de promover e executar conjuntamente políticas comuns.
Estamos, pois, todos de parabéns: os que herdámos a língua portuguesa, os que a escolhemos como língua identitária e aqueles que a falamos por todo o mundo.
Artigo da autora publicado no Diário de Notícias de 5 de maio de 2019.