Em português europeu e em português brasileiro,1 a diferença fundamental está no facto de que poder usar-se em orações subordinadas adjetivas relativas restritivas, desempenhando a função de sujeito ou objeto direo, enquanto o qual não ocorre nesse tipo de subordinadas nem como sujeito nem como objeto direto (nos exemplos seguintes, OK indica compatibilidade com o contexto, e *, incompatibilidade):
1 – «O rapaz OK que/*o qual tinha medo do escuro venceu os seus obstáculos.»
2 – «Estavas à procura do livro OK que/*o qual encontrei.»
As frases 1 e 2 tornam-se agramaticais quando o qual é empregado, como sujeito e objeto direto em orações subordinadas relativas restritivas.2
A respeito da relevância do número de sílabas para a seleção dos pronomes relativos que, quem ou o qual, remeto o consulente para a descrição de Celso Cunha e Lindley Cinta, na Nova Gramática do Português Contemporâneo (Lisboa, Edições João Sá da Costa, 1984, pág. 348):
«[...] [H]á casos em que a língua exige o emprego da forma o qual.
Precisando melhor:
a) o RELATIVO que emprega-se, preferentemente, depois das preposições monossilábicas a, com, de, em e por:
A verdade é um postigo
A que ninguém vem falar.
(Fernando Pessoa, QGP, n.º 21)
[...]
b) as demais preposições simples, essenciais ou acidentais, bem como as locuções prepositivas, constroem-se obrigatória ou predominantemente com o pronome o qual:
Tinha vindo para se libertar do abismo sobre o qual sua negra alma vivia debruçada.
(Miguel Torga, NCM, 49)»
Este princípio é retomado por Evanildo Bechara, na Moderna Gramática da Língua Portuguesa (Rio de Janeiro, Editora Lucerna, 2002, pág. 200):
«Em geral substitui-se que por o (a) qual depois de preposição ou locução prepositiva de mais de duas sílabas. Empregamos sem que ou sem o qual, a que ou ao qual, de que ou do qual, mas dizemos com mais freqüência apesar do qual, conforme o qual, perante o qual, etc. O movimento rítmico da frase e a necessidade expressiva exigem, neste casos, um vocábulo tônico (como o qual) em lugar e um átono (como que).»
Contudo, Bechara adverte em nota (ibidem, n. 1) que há uma pequena excepção à associação de preposições monossilábicas com o relativo quem, generalizável a que:
«A tradição tem evitado o emprego de sem quem, substituindo-o por sem o qual, sem a qual, sem os quais, sem as quais, para evitar o eco.»
É ainda de observar que as preposições com duas ou mais sílabas podem ocorrer com o relativo quem:
3 – «O homem OK com quem/OK sobre quem falei era muito rico.»
1 Esta resposta foi reformulada em 17/09/2010, na sequência de um reparo do consulente Fernando Bueno, de Belo Horizonte, Brasil (ver Textos Relacionados).
2 Com as referidas funções sintáticas, o qual ocorre em orações subordinadas relativas apositivas:
(i) «O rapaz de camisola amarela, o qual tinha medo do escuro, venceu os seus obstáculos.»
(ii) «Estava à procura do livro, o qual não tinha lido.»