De uma forma geral, o constituinte introduzido pela preposição com não é separado por vírgula do verbo sobre o qual incide, quer introduza um constituinte pedido pelo verbo (complemento oblíquo), como na frase (1), quer um constituinte não pedido pelo verbo (modificador do grupo verbal), como na frase (2):
(1) «Ele concorda com a Maria.»
(2) «Ele arranjou a cadeira com cola de madeira.»
Estes constituintes não levam vírgula porque não têm uma autonomia sintática ou prosódica relativamente ao predicado que integram.
No entanto, existem situações em que o sintagma preposicional introduzido por com assume autonomia prosódica e sintática, como acontece em (3), frase em que o constituinte tem a função semântica de comentário:
(3) «o João passou de ano e teve bons resultados, com todas as ajudas que teve.»
Neste caso, o sintagma preposicional é um constituinte periférico e leva vírgula a separá-lo da informação nuclear da frase, sobre a qual ele apresenta um comentário.
Note-se, ainda, que, com função de modificador, os sintagmas preposicionais introduzidos por com levam vírgula se intercalarem o verbo e os seus complementos, tal como ocorre em (4):
(4) «Ele cortou, com uma faca de serrilha, o pão fresco.»
O uso da vírgula pode também assinalar que o sintagma preposicional incide sobre o verbo nuclear da frase e não sobre o verbo de uma oração subordinada:
(5) «Ele ofereceu aquela cadeira secular para ser recordado por todos, com um gesto de simpatia.»
A vírgula poderá, ainda, ser usada estilisticamente, com o objetivo de destacar a situação descrita no sintagma preposicional, sobretudo em frase mais longas, nas quais o sintagma preposicional se encontra mais distante do núcleo verbal:
(6) «Ele ofereceu aquela cadeira secular ao seu neto, com um gesto de simpatia.»
No caso das frases apresentadas pelo consulente, a vírgula não é necessária do ponto de vista sintático e prosódico em (7):
(7) «João me encarou com os olhos abertos.»
Será necessário usar vírgula caso se pretenda assinalar que o sintagma preposicional incide sobre o constituinte «segurou a corda enquanto falava» e não apenas sobre o verbo falar. Estas diferentes relações sintáticas, que têm implicações semânticas, são assinaladas por parenteses retos em (8) e (9):
(8) «[Leslie segurou a corda](,) [enquanto falava com os olhos brilhando de entusiasmo].» (o brilho dos olhos acompanha o ato de falar)
(9) ««[Leslie segurou a corda enquanto falava], [com os olhos brilhando de entusiasmo].» (o brilho dos olhos acontece enquanto segura a corda)
Em (10), a vírgula será também aconselhável para barrar a interpretação em que o sintagma preposicional incide sobre o constituinte «olhar furioso», que não parece a correta:
(10) «Rose lançou um olhar furioso, com sua cabeça balançando.»
Relativamente à possibilidade de omissão da preposição com das frases acima, ela é possível, mas, é verdade que o resultado é mais artificial, pois constitui uma elipse.
Por fim, o sintagma preposicional introduzido por com pode, em diversas situações, ser substituído por uma oração gerundiva1, que será sempre introduzida por vírgula e é apenas um equivalente semântico, que naturalmente trará novas cambiantes à frase:
(11) «João me encarou, mantendo os olhos abertos.»
(12) «Leslie segurou a corda enquanto falava, mostrando os olhos brilhantes2 de entusiasmo.»
(13) «Rose lançou um olhar furioso, balançando a sua cabeça.»
Disponha sempre!
1. Cf., por exemplo, Raposo e Xavier in Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, pp. 1557-1559.
2. Nesta sugestão de reformulação, substitui-se o gerúndio de brilhando pelo adjetivo brilhantes, para evitar a coocorrência de duas formas no gerúndio na mesma oração.