Consideremos então:
(1) Passaram-se muitos anos.
(2) Passou-se muitos anos.
Na minha resposta a Márcio Coimbra, não afirmei que na frase (1) temos a voz passiva pronominal, porque aqui não há nenhum pronome. Disse, sim, que «o se podemo-lo considerar como palavra apassivante (ou apassivadora).»
No caso de este se ser pronome, teria de estar em vez dum nome, que só podia ser anos - muitos anos. Sendo assim, teríamos de interpretar da seguinte maneira:
(3) Muitos anos passaram-se a si próprios.
Esta interpretação é absolutamente descabida, mas penso que não pode haver outra, se considerarmos o se como pronome.
O se também não pode ser considerado como pronome indeterminante do sujeito. Só tal acontece, quando o verbo está na 3.ª pessoa do singular, à semelhança de frases como a seguinte:
(4) Aqui está-se bem = Aqui alguém (se) está bem. Alguém é um pronome que se refere à pessoa que estiver nesse local.
Só há, pois - pelo menos parece -, uma solução, que é considerar o se como palavra (ou partícula) apassivante. Se assim for, a frase «Passaram-se muitos anos» (ou «Muitos anos se passaram») = Muitos anos foram passados.
Na frase (2), se considerarmos o se como indeterminante do sujeito, visto o verbo estar na 3.ª pessoa do singular, teremos uma frase do tipo das seguintes, em que o se é indeterminante do sujeito:
(5) Sente-se frio neste lugar.
(6) Fica-se pasmado com tanta beleza.
Julgo que no Brasil nem todos os gramáticos aceitam o se como indeterminante do sujeito.
Talvez que a 2.ª edição da seguinte obra - muito boa - do brasileiro Napoleão Mendes de Almeida possa dar algum esclarecimento: «Dicionário de Questões Vernáculas».