Há, fundamentalmente, duas posições sobre a análise do elemento o quando ocorre na expressão «o que» :
a) é um pronome demonstrativo («o que mais jura mais mente» = «aquele que mais jura mais mente»; ver Evanildo Bechara, Moderna Gramática Portuguesa, Rio de Janeiro, Editora Lucerna, págs. 468/469);1
b) o que forma um todo e é um pronome relativo (ver Textos Relacionados).
Em termos gerais, perante a análise em a), direi que o não desempenha função sintáctica na oração introduzida por que (oração relativa), mas sim na oração precedente (oração subordinante). Optando pela análise b), é a expressão o que que tem uma função sintáctica na oração relativa.
No entanto, é preciso assinalar que a frase em análise inclui uma oração relativa de frase,2 porque «o que lhe foi concedido» exprime uma propriedade acerca da situação referida por uma frase «Pediu que lhe fornecessem papel de carta e que lhe restituíssem caneta» e reporta-se, em particular, ao conteúdo das duas orações subordinadas completivas que estão coordenadas, isto é, «que lhe fornecessem papel de carta e que lhe restituíssem caneta». Neste tipo de relativas não é possível interpretar o como um demonstrativo, como se vê no seguinte exemplo (o asterisco indica agramaticalidade):
(1) «Pediu que lhe fornecessem papel de carta e que lhe restituíssem caneta, *aquele/*aquilo que lhe foi concedido.»
Neste contexto, resta-me concluir que o que constitui um pronome relativo, desempenhando, por isso, funções sintáctivas como um todo. Como o verbo (na passiva: «foi concedido») concorda com o que, concluo também que este pronome tem a função de sujeito da oração relativa que introduz.
1 Também se pode encarar uma variante desta análise: o é um artigo definido que determina um substantivo que foi apagado e é antecedente do pronome relativo que («o que mais jura mais mente» = «o homem que mais jura mais mente») — o encontra-se, portanto, numa construção elíptica (ver Bechara, op. cit.).
2 João Andrade Peres e Telmo Móia, em Áreas Críticas da Língua Portuguesa (Lisboa, Editorial Caminho, 1995, págs. 270/271), distinguem orações relativas de nome, as quais têm por antecedente um nome, das orações relativas de frase, cujo antecedente é toda uma frase:
(i) «É preocupante a situação que acabas de descrever.» (relativa de nome)
(ii) «A Terra está a aquecer, o que constitui motivo de preocupação.» (relativa de frase)