DÚVIDAS

Sílabas métricas, sinalefa e vírgula

No decassílabo «E cava, em belas frontes, paralelas» (tradução pessoal de um verso de Shakespeare)*, as vírgulas são ou não desejáveis?

Pergunto isto, porque não sei se o uso da vírgula impede a sílaba métrica |va em|, e também porque não tenho a certeza se, de um ponto de vista gramatical, elas são realmente necessárias. A minha intenção é apenas impedir que a palavra paralelas possa ser considerada um adjetivo referente a frontes.

Obrigado.

 

N. E. – Trata-se de um dos versos do soneto 60 de William Shakespeare (1564-1616): «And delves the parallels in beauty's brow».

Resposta

 O uso da vírgula no verso não impede a constituição de uma sílaba métrica. A título de exemplo, recorde-se a análise em sílabas métricas do primeiro verso soneto de Camões proposta por Amorim de Carvalho no seu Tratado de versificação portuguesa, onde se prevê a sinalefa em /nha a/, independentemente de existir uma vírgula entre as duas vogais:

(1) «De quantas graças tinha, a Natureza» (cf. esta resposta)

Relativamente à correção do uso das vírgulas propostas, nada indica que estas sejam incorretas, uma vez que parecem ter sobretudo um efeito estilístico que realça o constituinte. Por outro lado, visto que é indesejável que o adjetivo paralelas seja associado a frontes, o que acontecerá na ausência de vírgula, este sinal de pontuação será mesmo necessário como auxiliar de interpretação do sentido da frase.

Disponha sempre!

 

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