Na frase apresentada, o adjetivo lírico tem a função de modificador do nome restritivo e o constituinte «à natureza», a função de complemento oblíquo.
O nome sujeito é um nome autónomo, ou seja, não seleciona um complemento, pelo que o adjetivo incide sobre ele associando-lhe propriedades adicionais, não necessárias, e restringindo o seu sentido1, funcionando, deste modo, como um modificador do nome.
Já o verbo dirigir-se é um verbo pronominal que rege a preposição a2, com o sentido de “ter como destinatário” (Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea). Neste caso, coloca-se a questão de identificar a função sintática desempenhada pelo constituinte introduzido pela preposição a: complemento indireto ou complemento oblíquo?
Como já referimos aqui, o complemento indireto, em geral, identifica-se pela possibilidade de substituição pelo pronome pessoal clítico dativo lhe, substituição que, no caso em apreço, parece oferecer dúvidas:
(1) «?O sujeito lírico dirigiu-se-lhe.»
No entanto, no Corpus do Português de Mark Davies é possível assinalar três casos deste uso como pretérito perfeito:
(2) «[…] dirigiu-se-lhe de a seguinte forma: " então não morreste?» (Jornal Público)
(3) «[…] este dirigiu-se-lhe: " Mas eu tenho de aturar isto? "» (Jornal Público)
(4) «Cristo dirigiu-se-lhe diretamente, reclamando mais um apóstolo […]» (Jornal Sol)
Não obstante a dúvida que estes usos anteriores podem levantar relativamente à função do constituinte substituído pelo pronome lhe, é importante que se recorde também que, segundo Gonçalves e Raposo, o seguinte teste auxilia na distinção entre o complemento indireto e o oblíquo introduzido pela preposição a (no âmbito do português-padrão)3:
(i) o complemento indireto não pode ser realizado pela sequência «a + pronome pessoal tónico»: «*Entregou o livro a ele»;
(ii) o complemento oblíquo admite a substituição por «a + pronome pessoal tónico»: «Recorreu aos amigos / Recorreu a eles»; «Obrigou o João a uma confissão / Obrigou o João a isso»4.
Se testarmos a frase em análise, verificamos que é possível substituir o constituinte «a natureza» por «a + pronome pessoal tónico»:
(5) «O sujeito lírico dirigiu-se a ela.»
Este comportamento sintático, associado ao facto de o verbo, na sua forma pronominal, reger a preposição a, indicam que o constituinte «a natureza» desempenha a função de complemento oblíquo.
Disponha sempre!
? marca a dúvida relativamente a aceitabilidade da frase.
1. cf. Raposo e Miguel, in Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, p.717 e 1085.
2. Tal como previsto em Busse, Dicionário sintáctico de verbos portugueses. Almedina, p. 176-177.
3. cf. Raposo et al., Ibidem, p. 1171
4. cf. Ibidem, p. 1172; exemplos adaptados. Ver também a resposta «Analise sintática de «Ceder ao sentimento» vs. «prestar atenção à leitura»»