A influência da Igreja na Idade Média permitiu que muitos termos do latim eclesiástico fossem adoptados pela língua medieval, muitas vezes eximindo as palavras assim introduzidas dos processos fonológicos que alteravam a maioria dos itens lexicais provenientes do latim vulgar. Sobre este assunto, cito Paul Teyssier (História da Língua Portuguesa, Lisboa, Edições Sá da Costa, 1982, pág. 20):
«As palavras eruditas ou semieruditas que ascendem àquela época distante [a da formação do galego-português] pertencem ao vocabulário religioso. Podem ser detectadas pelo facto de não terem sofrido certas transformações fonéticas normais no vocabulário do "património hereditário". Assim, cabidoo ("capítulo", no sentido eclesiástico), hoje cabido, que aparece no testamento de Afonso II (1214), representa o latim capĭtulus, empréstimo posterior à data em que todos os ĭ latinos se pronunciavam [e] (pois que ele conserva este i latino), mas anterior à queda do l intervocálico (uma vez que perdeu este fonema). É à mesma camada de termos religiosos que pertence (epĭscŏpus), pela conservação do seu i, assim como culpa e cruz (lat. cŭlpa, crŭcem), pela permanência do seu u. Foi também a Igreja, não resta dúvida, que impôs, em data muito antiga, a terminologia cristã dos dias da semana: domingo, segunda-feira, terça-feira, quarta-feira, quinta-feira, sexta-feira, sábado.»1
1 Por impossibilidade técnica, uso o símbolo fonético [e] para representar o chamado «é fechado» (ê). No original, o símbolo utilizado é um e com um ponto por baixo.