DÚVIDAS

A grafia de «forma sonata» (música)

Pediria uma orientação quanto ao hífen em três termos da rubrica de música: «forma sonata», «forma rondó» e «forma rondó sonata» (ou "forma-sonata", "forma-rondó" e "forma rondó-sonata"?).

Nos dicionários, encontro sonata e rondó como substantivos, jamais adjetivos. Em dicionário nenhum encontro "rondó-sonata", uma forma musical híbrida conhecida pelos melômanos e musicólogos.

Entretanto, no Houaiss eletrônico (v. 1.0, 2001), no verbete sonata, no comentário acerca da locução «sonata forma», lê-se «forma composicional clássica bitemática […]; forma sonata» (sem hífen). No mesmo dicionário, verbete forma, acepção «25: disposição dos elementos de uma peça musical […] modelo de composição», aparecem como exemplos «forma sonata» e «forma lied» (sem hífen).

No Novo Dicionário Eletrônico Aurélio (v. 5.0. 2004), verbete rondó, a acepção 4 prevê uso no sentido de «forma musical». Assim, rondó em si já significa «forma rondó», porém isso não afasta a prerrogativa de se lhe associar a palavra forma. Afinal, há ambiguidades, basta pensar em um movimento de concerto estruturado em rondó (aqui forma musical, não gênero do repertório).

Sinto-me inclinado a grafar "forma-sonata", "forma-rondó" e "forma rondó-sonata" porque em todos os casos ao menos dois substantivos se juntam para formar um novo significado, independente. Parece-me inafastável a independência visto haver sinfonias e aberturas operísticas feitas em forma-sonata (uma estrutura teórica, um esqueleto de construção). Ao mesmo tempo, há sonatas de todo alheias à forma-sonata. Desse modo, escapa-me o raciocínio a afastar o hífen, a não ser que caiba (ou se deva) considerar o aposto especificativo nesses casos todos, a exemplo de «espécie leão», «raça labrador». Talvez de acordo com tal lógica «forma sonata» apareça no Houaiss (grifando que lá não se encontre como verbete, mas sim em comentários de verbetes). Mesmo nessa hipótese ao menos “forma rondó-sonata” a mim parece necessitar de um hífen.

Peço desculpas pela longa exposição, que procurei reduzir ao máximo. Muito obrigado desde já.

Resposta

Pouco há acrescentar ao diagnóstico competente apresentado na questão.

O tipo de oscilações que ocorrem nos casos de «forma sonata» e «forma rondó» parece ocorrer também, por exemplo, nas  formas homólogas do italiano (salvaguardada a devida distância, porque esta língua tem uma ortografia bastante diferente da do português). Com efeito, a Enciclopédia Treccani aceita, para o italiano, duas grafias para «forma sonata» – com e sem hífen. Sendo assim:

a) se em «forma sonata» e «forma rondó» as palavras sonata e rondó forem analisadas como apositivas, dispensa-se o hífen;

b) no entanto, não é impossível a hifenização de modo a assinalar que se trata de um composto em que sonata e rondó perderam a função apositiva e, em associação com forma, constituem já unidades com sentido próprio.

Quanto a rondó-sonata, o hífen justifica-se porque se trata da associação de dois substantivos que se coordenam para formarem uma unidade lexical (composto) e gráfica que denota um género híbrido ou uma peça que concilia as duas formas.

Note-se, ainda, que o Dicionário Houaiss regista também como subentrada a sonata a expressão «sonata forma», também sem hífen, tal como acontece à forma «forma sonata» (subentrada a forma, no referido dicionário). Além disso, tendo em conta as observações do consulente, a sequência «forma rondó-sonata» configurará apenas um caso de aposição (para especificação) de rondó-sonata a forma. Daqui se infere que não se justifica um hífen extra e que, não podendo legitimar-se «forma-rondó-sonata», se deve aceitar «forma rondó-sonata».

 

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