A correlação de tempos verbais usados numa interacção discursiva directa não é a mesma da activada num regime discursivo de narração. Entenda-se aqui por «narração» não um género ou tipo de texto mas um colocar em distanciamento – no tempo, no espaço e na ordem geral das coisas – uma dada situação em relação às circunstâncias imediatas de interlocução.
Assim, num contexto (contexto 1) em que um “eu” se dirige a um “tu” num “aqui” e “agora”, os tempo verbais activados são:
Pretérito Perfeito/
/Pretérito Imperfeito (simples ou, preferencialmente, perifrástico) ——— Presente ————— Futuro (ou presente futural)
Ex.:
«– Mãe, eu realmente copiei no teste, mas prometo que não mais o farei.»
Em contrapartida, num contexto (contexto 2) em que se fale de um “ele” situado num “lá”, “então”/“naquela altura” os tempo verbais em questão são:
Pretérito Mais-Que-Perfeito ——— Pretérito Perfeito/Pretérito Imperfeito ——— Futuro do Pretérito (designado na gramática tradicional por «modo condicional»)
No contexto 1, as informações adjacentes ao a(c)to comunicativo estão implicitadas dado que há um saber prévio compartilhado pelos intervenientes no diálogo, mas, no contexto 2, todas as informações têm de ser explicitadas, dado que as circunstâncias são alheias ao “eu” – “tu”.
Ex.:
«Naquele dia, o Zé reconheceu que tinha copiado no teste e prometeu que nunca mais o faria.»
Confronte-se o enunciado dado:
a) «Pensaste no que eu te tinha dito?» (enunciado do contexto 1)
com um enunciado correspondente do contexto 2:
b) «Foi naquele momento que o Zé pensou no que lhe tinham dito.»
e veremos que a forma mais plausível de ocorrência do enunciado a) é «Pensaste no que eu te disse?». Quer em a) quer em b), a acção de dizer é anterior à acção de pensar, no entanto o uso do Pretérito Mais-Que-Perfeito em a) causa alguma estranheza. Uma explicação pode estar justamente no facto de no contexto 2 ser necessário explicitar essa relação de anterioridade, ao passo que no contexto 1 essa relação temporal já é consabida.