Gostaria imensamente de ponderar a respeito da resposta à pergunta Os advérbios rapidamente e rápido feita pela consulente Maria Eduarda Nunes e respondida pela colaboradora Carla Viana, publicada no dia 11/11/2005.
Todos os que consultam este espaço têm a certeza de contar com a imparcialidade com que as duas variantes da língua são tratadas por aqui, sendo esta uma das razões de ser e também do sucesso deste sítio. Neste aspecto, o Ciberdúvidas inovou e criou sua maneira muito própria de escrita, de forma a apresentar a grafia vigente nas duas variações da nossa língua comum. Portanto, ninguém em sã consciência pode considerar que o Ciberdúvidas, e por extensão todos os seus colaboradores, seja tendencioso em relação ao uso da língua. É com este espírito que faço esta pequena e humilde observação que doravante descrevo.
Imagino que não seja desconhecida por ninguém neste espaço a existência de uma propensão lusitana em considerar a língua comum praticada no Brasil como sendo de qualidade duvidosa; a chamada "língua brasileira". É claro que toda generalização é injusta, mas uma pequena busca aqui mesmo neste sítio e o assunto torna-se bastante claro. Inúmeras foram as vezes que os colaboradores tiveram de responder a questões relacionadas a isto. Os exemplos são tantos e tão fáceis de achar, que seria demasiado citá-los todos aqui; mas vão desde o uso de estrangeirismos, reclamações sobre "brasileirismos" (controvérsias do "apagão", por exemplo), adoção de dicionários (Aurélio), indo até a nossa famosa preferência pela próclise.
Diante disto, quero observar que não tenho dúvidas quanto ao fato de que a colaboradora teve meramente a intenção de realizar a sua tarefa da melhor maneira possível. Entretanto, forneceu algumas informações absolutamente desnecessárias à compreensão da resposta e, inadvertidamente, oxigênio a uma chama que infelizmente este próprio sítio não conseguiu apagar.
Explico-me: a menos que tenha havido alguma correção no texto da consulente, há fortes indícios de ser uma usuária habitual da variação portuguesa da língua. O uso da palavra adjectivo, com o "c" mudo, e do substantivo comboio (no Brasil usa-se trem) dão esta forte indicação (perdoem-me se houve alguma correção ou adaptação no texto original, gerando esta minha impressão incorreta). Desta forma, estando a consulente a escrever do Canadá e não havendo nenhuma outra informação, não há como supor nenhuma referência ao Brasil na sua pergunta. A consulente apenas observa que hoje, diferente do passado, usa-se "rápido" como advérbio, o que para ela seria impensável. A comparação por ela realizada é temporal, e não geográfica.
Então como é que o Brasil aparece nesta história? Qual o motivo para associá-lo, ainda que de forma bastante elegante, à divergência da norma culta? É bem verdade que a consultora deixou claro que este fenômeno é comum em todas as línguas românicas, mas a mensagem da rebeldia brasileira em relação à norma culta ficou lá. Uma vez que não há nenhuma ligação aparente da consulente ao Brasil, e este foi usado como exemplo para a resposta, seria de imaginar que não houvesse aqui em Portugal qualquer hipótese de existência de exemplos deste tipo específico de rebeldia.
De fato, eu falaria sem pestanejar «o trem correu rápido», mas os portugueses não falariam? Para mim é tão claro que a consulente não é brasileira, que a resposta soou-me como a constatação definitiva de que apenas nós poderíamos ter realmente cometido tal heresia e que a colaboradora tinha sido muito indulgente conosco; rebeldes brazucas.
Já havia entregue os pontos quando ouvi alto e claro na televisão: «Gostei imenso da tua visita!». Meu Deus, como eu podia ter-me esquecido. Assim que cheguei a Lisboa, em junho deste ano, naqueles primeiros dias de adaptação dos ouvidos à maneira lisboeta de falar, uma das coisas que impressiou-me "imenso" foi justamente o uso freqüente, até exaustivo, da palavra "imenso" ao invés de "imensamente". Ouvi-a diversas vezes na televisão e pessoalmente. Li-a freqüentemente em jornais e anúncios publicitários.
Tantas foram as vezes, que acabei assimilando o seu uso e esqueci ter-me parecido tão flagrantemente mal empregada aos meus ouvidos brasileiros. Lembro-me de ter comentado com minha esposa que jamais um brasileiro falaria assim. Este é mais um motivo para acreditar que a colaboradora não tenha feito por leviandade, visto que é obviamente mais fácil detectar rebeldias alheias, tal qual fiz eu nos primeiros dias aqui.
Para dirimir minhas dúvidas, fui direto ao Google e digitei sem hesitação a pesquisa «correr rápido», apenas respostas em endereços terminados por "pt" (a consulta fica assim: «correr rápido» site:.pt), e o resultado foi 44 páginas. Apontei para a próxima: «conduzir rápido» e o resultado foi 27 páginas. Mais uma vez e, desta, melhorei a pontaria: «andar rápido», agora sim, 700 páginas. Definitivamente, descontando os casos em que "andar" era substantivo, os portugueses, pelo menos aqueles que usam a "internet", usam o "rápido" em lugar do "rapidamente".
Tenho conhecimento do valor dos colaboradores deste espaço. Sei também que sou um mero usuário nativo da língua, e sujeito a todos os vícios lingüísticos que provavelmente este texto revela. Não estou a salvo de erros nem de enganos. Mas é muito claro para mim que o processo de comunicação é um tanto ou quanto complexo e, portanto, todo cuidado é muito pouco.
Dizer que uma variação é rebelde em relação à norma culta para responder a uma questão que não implica em diferenciação entre as variantes da língua é completamente contra o discurso do Ciberdúvidas, ou eu é que entendi errado?
A qual norma culta a colaboradora se refere em «Em português europeu, a influência da norma culta é mais forte do que no Brasil, e por isso a freq[ü]uência do advérbio em -mente aumenta.»? A do Brasil ou de Portugal?
Aqueles que não souberem da existência das normas européia e brasileira facilmente depreendem que a língua praticada no Brasil só entra nos eixos a fórceps e que a de Portugal é praticamente a perfeição. Portanto diferencia, atribuindo pesos distintos, as variações oficiais existentes. Desta forma, a citação em nada contribui com o histórico deste sítio.
Não é uma questão apenas de dizer se a resposta está certa ou errada do ponto de vista gramatical ou culto, mas, sim, de mostrar que interfere na forma como as variações são tratadas neste espaço. Fica aqui então o meu pedido de reforço na vigilância pessoal por parte dos colaboradores de maneira a evitar qualificações ou desqualificações desnecessárias em relação às variações oficiais da língua portuguesa.
Grato
Machado de Assis escreveu uma história, muito conhecida, a que deu o nome de "Um apólogo". Suponhamos que outro escritor tenha a idéia de escrever um conto, um apólogo, mantendo, embora com um tema totalmente diferente, a estrutura narrativa do texto de Machado, o número de personagens, a inusitada conversa entre objetos, finalizando com uma reflexão de cunho moral.
O que é esse texto? Não é uma paródia, pois não há intenção humorística; não é paráfrase, que o tema é diferente; tampouco seria plágio, pois o hipotético escritor tem a clara intenção de fazer o leitor reportar-se ao apólogo de Machado, mediante referências às vezes sub-reptícias, às vezes evidentes. Seria uma recriação literária?
Agradeço a gentileza da resposta.
Não sei bem se ponha ou não uma vírgula antes de um sujeito posposto. O que é que o Ciberdúvidas acha?
Por exemplo, a frase «Tem até alguma graça, esta diversidade toda» deve ou não ter a vírgula que lá pus? E a frase «É um irreverente, o João!»
E, já agora, qual a solução se o verbo for omitido? Por exemplo, em «Tempos terríveis, os nossos!», deve ou não aparecer a vírgula?
Agradecendo mais um auxílio vosso,
Gostaria de saber qual a forma correcta de escrever oianense (habitante da vila de Oiã, sede de uma das maiores freguesias do distrito de Aveiro). Já vi a palavra escrita com til (oiãnense) e sem til (oianense).
Felicito-vos pelo vosso trabalho. Surpreende pela qualidade e abrangência, mas, ainda mais, pela existência. Ainda há esperança.
Gostaria que me dessem a vossa opinião sobre a seguinte dúvida: “Lenin” ou “Lenine”? “Stalin” ou “Estaline”?
Nos dicionários que consultei, sobrenome e apelido são sinónimos. Não é isso, contudo, o que diz o sábio Dr. José Leite de Vasconcelos:
No seu livro Antroponímia Portuguesa, estabelece claramente a diferença. Por exemplo, em Maria da Piedade Barros, Maria será o nome próprio, Piedade ,o sobrenome, e Barros, o apelido.
Ou seja, o sobrenome é o segundo nome próprio.
Gostaria de ser esclarecido.
No que diz respeito às aves, os ingleses costumam usar a expressão "King of Birds" para designar a águia-real (“Golden Eagle”) que, no seu entender, ocupa o lugar cimeiro na hierarquia dos vertebrados alados.
No caso português, a águia-real também ocupa esta posição de topo, contudo ninguém usa a expressão "Rei das Aves", sendo porém frequente ler-se "Rainha das Aves" para designar esta espécie (ou outras águias).
Em meu entender, este é mais um daqueles casos em que se mistura género com sexo. Ou seja, como a palavra "águia" é do género feminino (mesmo para as águias-machos), atribuiu-se-lhe o termo "rainha" (que apenas se aplica a fêmeas, logo é um termo de género e sexo feminino, por assim dizer).
Em rigor, e por muita confusão que isso possa fazer, julgo que escrever "A águia é o rei das aves" é perfeitamente correcto.
Gostaria de saber a vossa opinião sobre este assunto.
N.E. O consulente escreve segundo a Norma de 1945.
Qual é a regra do “c” cedilha não acompanhar as vogais E e I, o “ç” só combina com as vogais A, O, U. Por quê?
Muito obrigada!
Na genética, aos indivíduos híbridos, simultaneamente para dois caracteres, dá-se o nome de “dihíbrido”. Contudo, deverá grafar-se com ou sem “-h”?
Agradeço antecipadamente o esclarecimento.
Gostaria de colocar-lhes, hoje, duas questões de sintaxe sobre as quais agradecia o vosso sempre apreciado e autorizado comentário. A primeira relaciona-se com a classificação das orações na frase de abertura do "Sermão de Santo António aos peixes" do inimitável padre António Vieira: «Vós, diz Cristo Senhor Nosso, falando aos pregadores, sois o sal da terra:»
Afiguram-se-me as seguintes hipóteses de classificação:
Hipótese 1
1.ª oração: «Vós. sois o sal da terra», oração subordinante; 2.ª oração: «diz Cristo Senhor Nosso», oração subordinada explicativa (justificada por estar entre vírgulas); 3.ª oração, «falando aos pregadores", oração subordinada gerundiva (temporal).
Hipótese 2
1.ª oração: «Vós sois o sal da terra», oração substantiva subordinada conjuncional integrante (subentendendo-se a conjunção integrante “que”, pedida pela forma verbal “diz”, verbo declarativo; 2.ª oração: «diz Cristo Senhor Nosso», oração subordinante; 3.ª oração: como no primeiro caso, subordinada gerundiva, com valor temporal.
Hipótese 3
Considerar a parte de frase «diz Cristo Senhor Nosso, falando aos pregadores» como a frase introdutória do discurso da personagem (por conter uma expressão declarativa «diz Cristo Senhor Nosso» e «Vós sois o sal da terra» como discurso directo (da personagem, Cristo Senhor Nosso).
Assim, na primeira frase teríamos que a primeira oração seria a subordinante, a segunda, subordinada gerundiva de valor temporal e «Vós sois o sal da terra», uma oração substantiva com o valor de complemento directo do verbo dizer.
[...]
Este é um espaço de esclarecimento, informação, debate e promoção da língua portuguesa, numa perspetiva de afirmação dos valores culturais dos oito países de língua oficial portuguesa, fundado em 1997. Na diversidade de todos, o mesmo mar por onde navegamos e nos reconhecemos.
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