Sara Mourato - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara Mourato
Sara Mourato
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Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2 pela mesma instituição. Com pós-graduação em Edição de Texto pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, trabalha na área da revisão de texto. Exerce ainda funções como leitora no ISCTE e como revisora e editora do Ciberdúvidas.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Devo dizer «30 kilowatts hora» ou «30 kilowatt hora»?

Resposta:

Do ponto de vista estritamente linguístico, o plural é «30 kilowatts-hora» ou, na grafia parcialmente aportuguesada, «30 quilowatts-hora», de acordo com o  Dicionário da Língua Portuguesa da Academia das Ciências de Lisboa. Note-se que se trata de um composto hifenizado, formado por dois nomes, kilowatt e hora1.

Quando utilizamos o símbolo que representa esta unidade, escrevemos kWh (cf. Infopédia), que não se pluraliza2. Neste formato, o símbolo permanece invariável, independentemente de ser singular ou plural: «30 kWh».

 

1 Ver também o Portal da Língua Portuguesa.

2 Conforme Guilherme de Almeida observa, «Os símbolos das unidades nunca se escrevem no plural» ("Sobre os nomes e símbolos das unidades físicas"). Em Sistema Internacional de Unidades (S). Grandezas e Unidades Físicas. Terminologia, símbolos recomendações (Plátano Editora, 2002, p. 168), que é do mesmo autor, regista-se a forma quilowatt hora (sem hífen) e o sím...

Já foi vítima de <i>quishing</i>?
Anglicismos e códigos QR

O que define o novo tipo de ciberataque denominado quishing? Haverá tradução do mesmo para português? A estas perguntas responde a consultora Sara Mourato, num texto onde reflete sobre os neologismos que surgem na área dos ciberataques e, consequentemente, da cibersegurança.

Pergunta:

Pode dizer-se «certidão que instrói o recurso», ou deve, apenas, dizer-se «certidão que instrui o recurso»?

Resposta:

A conjugação do verbo instruir, que, neste contexto significa «fornecer os elementos necessários para a análise de um recurso», na terceira pessoa do singular do presente do indicativo, é instrui. Por essa razão, o correto seria: «certidão que instrui o recurso». 

 A forma "instrói" está incorreta, pois deriva de uma analogia popular com verbos como construir. O verbo instruir segue a conjugação de outros verbos como atribuir, constituir ou contribuir, portanto a forma correta no presente é instrui. A variante (incorreta) "instrói" pode aparecer em alguns contextos informais ou irónicos, mas não deve ser utilizada em textos jurídicos ou formais, onde é esperado o uso padrão da língua.

Pergunta:

O neologismo “sobremesariano” é formado por qual tipo de derivação?

Resposta:

Sobremesariano, um adjetivo que surge na banda desenhada Calvin and Hobbes, é a maneira divertida que a personagem Calvin encontra para descrever a sua dieta baseada exclusivamente em sobremesas.

Esta palavra é formada pela combinação do substantivo sobremesa com o sufixo -(i)ano, que deriva do latim -anus, -a, -um, amplamente utilizado na formação de adjetivos em português. Contudo, inclui ainda um -r-, contrariando os padrões morfológicos do português e operando por analogia com a sequência -riano de vegetariano.

Com isto, Calvin enfatiza que a sua alimentação consiste apenas em sobremesas, «fruta, doce ou queijo que se come no fim de uma refeição principal» (Infopédia).

Pergunta:

Há diferença entre «em razão disso» e «razão pela qual»?

Será que se trata de expressões com o mesmo significado, ou, então, como devo empregar as duas expressões supracitadas?

Obrigado.

Resposta:

As expressões «em razão disso» e «razão pela qual» têm sentido causal ou explicativo, mas apresentam diferenças sintáticas, apesar de ambas indicarem uma relação de causa e consequência.

A expressão «em razão disso» funciona como um modificador do grupo verbal que parece estar a fixar-se na língua. Atua como uma locução adverbial e explica o motivo de algo que já foi mencionado anteriormente, introduzindo uma consequência ou explicação direta. Vejamos um exemplo:

(1) «A economia desacelerou. Em razão disso, novos cortes no orçamento foram realizados.»

Em (1) a expressão liga a desaceleração da economia à necessidade de cortes.

Já a expressão «razão pela qual» é uma construção relativa que conecta duas orações, onde a primeira apresenta uma situação e a segunda oferece a justificação:

(2) «O projeto falhou devido à falta de planeamento, razão pela qual a equipa foi reestruturada.»

Em (2) a expressão explica o motivo da reestruturação.

Note-se que o uso desta expressão é mais erudito do que «em razão disso».