Maria Eugénia Alves - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Maria Eugénia Alves
Maria Eugénia Alves
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Professora portuguesa, licenciada em Filologia Românica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, com tese de mestrado sobre Eugénio de Andrade, na Universidade de Toulouse; classificadora das provas de exame nacional de Português, no Ensino Secundário. 

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Como se deve dizer ou escrever: «Entre eu e tu não há divergências» ou «Entre mim e ti não há divergências»?

Resposta:

A tradição gramatical aconselha o emprego das formas oblíquas tónicas*  depois da preposição entre.

Exemplo: «Que diferença há entre mim e um fidalgo qualquer?» (Luís de Sttau Monteiro, Felizmente há luar!)

Na linguagem coloquial predomina, porém, a construção com as formas retas (eu, tuele, ela, nós, vós, eles, elas), construção que se vai insinuando na linguagem literária:

                             «Entre eu e tu,

                             tão profundo é o contrato,

                             que não pode haver disputa.» (José Régio, As Encruzilhadas de Deus**)

Assim, ambas as propostas feitas pelo consulente estão corretas.

 

Quanto à acentuação, nos pronomes pessoais distinguem-se as formas átonas (me, te, o, a, lhe, nos, vos, lhes, os, as, lhes) e as tónicas (mim, comigo, ti, contigo, ele, ela, nós, connosco, vós, convosco, eles, elas).

** in&...

Pergunta:

«...anexo esta sebenta que é um conjunto de textos, documentos, orientações e apontamentos importante para a disciplina de ...»

A palavra «importante» fica no singular («conjunto») ou no plural («textos, documentos...».)?

Resposta:

É possível fazer frases gramaticais com ambas as hipóteses apresentadas.

1. Pode referir-se ao «conjunto de textos», e o particípio/adjetivo ficará no singular, uma vez que a tónica é posta no «conjunto»:

«...anexo esta sebenta que é um conjunto de textos, documentos, orientações e apontamentos importante para a disciplina de ...»

2. Pode referir-se ao substantivo mais próximo («documentos») e, nesse caso, faz a respetiva concordância:

«...anexo esta sebenta que é um conjunto de textos, documentos, orientações e apontamentos importantes para a disciplina de ...»

 

Cf. A concordância do particípio com «conjunto de...»/«uma grande quantidade de...»

Pergunta:

Por favor, como devo dizer quando deito um álcool por cima de qualquer alimento e depois lhe deito fogo, estou a flamejar ou a flambear?

Obrigado

Resposta:

Há vários vocábulos para designar a operação referida pelo consulente:

• O Dicionário Priberam admite flambar ou flambear (francês flamber); 

• O Dicionário Infopédia, Porto Editora reitera o verbo flambar: em culinária, significa cozinhar (alimentos), vertendo bebida alcoólica sobre eles e ateando-lhes fogo;

• Finalmente, o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea apresenta: flambar (= flamar), cul., fazer arder superficialmente regando com um pouco de brande ou de outra bebida alcoólica a que se deita fogo.

Pergunta:

Gostava que me dissessem qual a função sintática desempenhada pelo pronome relativo "que" na frase «O mesmo sol que abre os céus»  [Mensagem,  Fernando Pessoa].

Resposta:

      Os pronomes relativos, estando na oração seguinte, retomam um termo já expresso na oração anterior, de forma a evitar  repetições que possam interferir na qualidade do discurso proferido.

     Ao contrário das conjunções, que são meros conectivos, e não oferecem nenhuma função interna nas orações por elas introduzidas, estes pronomes desempenham sempre uma função sintática nas orações a que pertencem.

 «Quero ver do alto o horizonte/ que foge sempre de mim.» (Olegário Mariano, Toda uma vida de poesia)

O pronome relativo que substitui o seu antecedente, representado pelo vocábulo “horizonte”. Neste caso, ele exerce a função de sujeito da oração.

Acontece o mesmo no exemplo solicitado para análise:

«O mesmo sol que abre os céus/ É um mito brilhante e mudo – (...)»,  (Fernando Pessoa, Mensagem, poema Ulisses)

 (que= sujeito de abre)

 Fonte: 

Pergunta:

Qual a concordância correta: «ele adquire conhecimentos que o torna capaz de...» ou «ele adquire conhecimentos que o tornam capaz de...»?

Resposta:

    A frase correta é a segunda: «ele adquire conhecimentos que o tornam capaz de ...», sendo este que um pronome relativo que estabelece uma relação com o antecedente («conhecimentos»). Tem por isso de concordar com ele.

    Além disso, este pronome introduz uma oração que o caracteriza ou qualifica, designando-se por oração subordinada adjetiva restritiva.

    Vejam-se os seguintes exemplos:

    1. «Os jogadores que terminaram os treinos dirigem-se aos balneários*.»

     A oração assinalada (subordinada adjetiva restritiva) restringe o âmbito do antecedente: só os jogadores que terminaram os treinos é que foram para o balneário*.

     2. «Prefiro quadros que copiam a natureza.»

     3. «Perdi aquele livro que retratava a sociedade atual.»

   Em todos os exemplos apresentados se verifica a concordância do pronome que com o seu antecedente.

 

* balneário (em Portugal) = vestiário (no Brasil).<...