Pergunta:
Mais uma vez recorro ao vosso muito útil apoio.
Creio que o sentido destes versos, que Camões põe na voz do Adamastor, será o de que o emissor ["Eu"] não conseguiu resistir à ilusão, foi ludibriado por Tétis e Dóris. Será? Contudo, à letra parece ser exatamente o contrário. Como explicar esta negação?
Obrigada, desde já!
Resposta:
O episódio do Adamastor é um dos mais relevantes da obra épica Os Lusíadas e situa-se entre as estrofes 37 e 60, do canto V. É aqui que é narrado o encontro entre a armada de Vasco da Gama e o mostrengo Adamastor, um dos protagonistas do episódio.
O verso a que a consulente faz referência pertence à narração que o Adamastor faz dos acontecimentos que o fizeram transformar-se num penedo e está inserido na seguinte frase, da estrofe 54: «Eu, que cair não pude neste engano / (Que é grande dos amantes a cegueira), / Encheram-me, com grandes abondanças, / O peito de desejos e esperanças.». Note-se que, quando o Adamastor declara «que cair não pude neste engano», está, na realidade, a manifestar que não conseguiu perceber que Dóris, mãe de Tétis, ninfa por quem nutria uma paixão, o estava a ludibriar, pois, a construção «cair no engano», no português da época quinhentista significa, tal como explica Sousa da Silveira, «percebê-lo, dar por êle.»1.
Portanto, neste verso, o Adamastor declara que não percebeu que Dóris e Tétis o tinham enganado, levando-o a acreditar que poderia ter uma noite de prazer com a ninfa que amava. É este engano que o leva a, numa noite, cansado da guerra que trava com Neptuno pelo ...