Filipe Carvalho - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Filipe Carvalho
Filipe Carvalho
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Mestre em Teoria da Literatura (2003) e licenciado em Estudos Portugueses (1993). Professor de língua portuguesa, latina, francesa e inglesa em várias escolas oficiais, profissionais e particulares dos ensinos básico, secundário e universitário. Formador de Formadores (1994), organizou e ministrou vários cursos, tanto em regime presencial, como semipresencial (B-learning) e à distância (E-learning). Supervisor de formação e responsável por plataforma contendo 80 cursos profissionais.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual é mais correto: «Deram-me uma mensagem que comunicar» ou «Deram-me uma mensagem a comunicar»? «Disseram-me os passos que dar na obra» ou «disseram-me os passos a dar na obra»?

Outra pergunta: diz-se «ordenar alguém sacerdote» ou «ordenar alguém como sacerdote»? Diz-se, também, «sagrar alguém sacerdote» e «ungir alguém rei»? Sendo assim, deve, também, dizer-se «coroar alguém rei» e não «coroar alguém como rei»?

Grato, como sempre.

Resposta:

A frase «Deram-me uma mensagem que comunicar» está correta, porque a conjunção tem um valor de complemento. Assim, esta frase terá um valor equivalente a «Deram-me uma mensagem para comunicar.»

Também a frase «Deram-me uma mensagem a comunicar» estará certa, uma vez que  pode haver correspondência de significado entre para e a, tendo ambas as palavras origem no termo latino ad [cf. António Gomes Ferreira, Dicionário de Latim Português, Porto Editora, 1987] .

Relativamente às frases que se seguem, considera-se correta: «Disseram-me os passos que dar na obra». Esta frase é equivalente a: «Disseram-me os passos que [devo] dar na obra.» A omissão do verbo não inviabiliza que a frase esteja correta.

Do mesmo modo, estará em conformidade: «Disseram-me os passos a dar na obra.», semelhante a: «Disseram-me os passos para dar na obra.» ou ainda, «Disseram-me os passos para eu dar na obra», «Disseram-me para eu dar os seguintes passos na obra» e «Disseram-me os passos que eu devo dar na obra». De sublinhar que as orações subordinadas substantivas completivas* [«... os passos que (a) dar na obra] estão condicionadas pelo verbo declarativo [dizer]. Quem diz, diz alguma coisa, neste caso, «[...] os passos que dar na obra» ou «[...] os passos a dar na obra.»

A frase «Ordenar alguém sacerdote» tem um significado ligeiramente diferente de «Ordenar alguém como sacerdote», uma vez que, na primeira frase, se está a identificar o que se ordena; alguém é ordenado sacerdote.  Na segunda frase, es...

Pergunta:

Sempre fico em dúvida sobre o quão longe o verbo deve estar do "termo atrativo" para usar-se a ênclise. Vejam estes casos:

1. Ele afirmou que se usa assim. 2. Ele afirmou que isso se usa assim. 3. Ele afirmou que a próclise se usa assim. 4. Ele afirmou que a próclise sempre se usa assim. 5. Ele afirmou que em todos os casos a próclise se usa assim. 6. Ele afirmou que em todos os casos, sem exceção, a próclise se usa assim. 6. Ele afirmou que em todos os casos, sem absolutamente nenhuma exceção, a próclise sempre, sempre, se usa assim.

Os exemplos não estão muito bons, mas dá pra ilustrar a questão. Em qual desses pontos deve-se parar de usar a próclise e começar a usar a ênclise e porquê?

Resposta:

próclise, a mesóclise e a ênclise estão sujeitas a regras estipuladas pelas gramáticas; por exemplo, a gramática de Evanildo Bechara, Moderna Gramática Portuguesa, Rio de Janeiro, Editora Lucerna, 2001, 37.ª ed., p. 587.

A próclise, que é a colocação do pronome oblíquo átono antes do verbo, está condicionada pelos seguintes casos:

– com palavras ou expressões negativas.

– com conjunções subordinativas.

– com advérbios.

– com pronomes relativos, demonstrativos e indefinidos.

– em frases interrogativas.

– em frases exclamativas ou optativas que transmitam desejo.

– com o verbo no gerúndio antecedido da preposição em.

 

No caso apresentado, «Ele afirmou que se usa assim», está-se perante uma frase complexa constituída por uma oração subordinante e outra subordinada substantiva completiva (onde se usa a próclise). Respeita, pois, a regra gramatical. A junção dos novos elementos ao enunciado não modifica a relação de subordinação entre as duas orações e as funções sintáticas que se estabelecem, razão pela qual a próclise se deve manter, independentemente do quão longe possa estar o verbo do “termo atrativo”. Por este motivo, sabendo-se que a ênclise [colocação do pronome átono depois do verbo] se deve utilizar com:

– verbo no inf...

Pergunta:

Gostaria de saber se me conseguiriam esclarecer a seguinte dúvida. Estava a falar com uns amigos e chegamos a uma dúvida sobre a localização Saldanha em Lisboa. Deveremos dizer «no Saldanha», «em Saldanha» ou «na Saldanha», uma vez que é uma praça. A maior parte das referências dizem «no Saldanha», mas o facto de ser uma localização/praça deixa-nos com mais dúvidas ainda. Obrigado.

Resposta:

Admitem-se as expressões «no Saldanha» ou «na Saldanha», se se considerar como válida a omissão de vocábulos que completam o sentido do enunciado. 

Não é de estranhar, se se disser: «No largo do Saldanha há uma festa.» Da mesma forma, é aceitável afirmar-se: «Na praça do Saldanha existe uma estátua.» A omissão dos vocábulos “largo” e “praça” originam as seguintes frases: «No Saldanha há uma festa» e «Na Saldanha existe uma estátua», respetivamente. 

Da mesma forma, se diz: «Vamos a um restaurante na [praça] Luís de Camões» ou «Vamos ao Camões beber um copo.» 

A omissão também acontece com as ruas: «Ela foi à farmácia da Bela Vista.» 

A expressão «em Saldanha» não parece a mais correta, uma vez que, sendo o topónimo baseado num nome próprio, Saldanha, tendo em conta a regra geral, este termo deve ser precedido por um artigo. Relativamente a estas questões, poder-se-á consultar a obra de José Pedro Machado, Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa. 

Pergunta:

Porque é que animé, empréstimo do japonês (アニメ), que de si é um empréstimo abreviado do inglês (Animation) é apresentado como substantivo masculino quando o sua origem («animação») é feminina? Tenho reparado que o mesmo se passa em espanhol, francês e italiano, mas não encontro uma razão para tal. Não devia animé ser feminino, ou, pelo menos, um substantivo comum de dois géneros?

Resposta:

O animé é uma palavra que vem do japonês アニメ e que já está dicionarizada, sendo considerada masculina. A escolha do género em português poderá ter-se baseado em duas razões: ou porque significa desenhos animados, sendo esta expressão masculina, ou por influência de outras línguas europeias.Pensa-se que este vocábulo japonês tenha tido a sua origem no inglês animation ou no francês animé.

Por outro lado, animação é um nome ou substantivo que vem do verbo latino animo, -are, sendo uma palavra de origem feminina. As palavras portuguesas terminadas em - ção são do género feminino, sendo exceção o vocábulo coração

Pergunta:

Quando falamos de percentagens, frequentemente se utiliza a preposição "de", como, por exemplo, «Ele pagou uma taxa de juro de 2,5%.» e «Uma percentagem de 30% dos alunos gostaria de estudar no estrangeiro.» No caso de querermos responder diretamente à questão «Qual é a percentagem?» devemos utilizar o "de" ou não?

a. A percentagem é de 6%. b. A percentagem é 6%.

Num manual de ensino de português a chineses aparecem as duas construções no mesmo texto e, confrontada com a dúvida, não consegui encontrar explicações que me remetam para uma regra.

Muito obrigada pela atenção e ajuda.

Resposta:

É mais apropriado a frase «A percentagem é 6%.» Repare-se que 6% tem a função de nome predicativo do sujeito e deve fazer a concordância com o sujeito. O verbo ser identifica qual é a percentagem e, por isso, esta não faz sentido estar precedida por de. A preposição procede o verbo ser quando se pretende salientar a origem («O rapaz é de Faro») ou quando se deseja referir à substância («O copo é de plástico»), ou pertença («O lápis é do Luís»). 

A utilização frequente da preposição de nestes casos prende-se com o facto de o vocábulo percentagem costumar vir acompanhado de um complemento do nome, que se situa à direita do nome, regido pela preposição de; por exemplo: «A percentagem de alunos...», «A percentagem de 10%...», etc. Tal acontece, também, com os vocábulos média quantidade: «A média de alunos...», «A quantidade de pessoas...» 

Curioso verificar, num dos exemplos que nos apresentaram, a questão relacionada com a concordância verbal: «Uma percentagem de 30% dos alunos gostaria de estudar no estrangeiro.» Segundo Evanildo Bechara (Moderna Gramática Por...