Pergunta:
É frequente assinalar-se o que do verso «Que eu canto o peito ilustre lusitano» como causal.
No entanto, na pergunta 31 499, o que do exemplo «Empresta-me o teu dicionário, que deixei o meu em casa» é classificado como explicativo.
Não são as duas frases semelhantes? Nesse caso, poderíamos classificar a oração desse verso d´Os Lusíadas como explicativa?
Confesso que a noção de orações coordenadas explicativas aplicada a estes dois exemplos me causa alguma dificuldade. Compreendo perfeitamente o exemplo dado no Dicionário Terminológico, mas não tenho a certeza.
A indicação, dada em várias fontes, de que a coordenada explicativa não pode ser colocada no início da frase não está, por outro lado, de acordo com a explicação dada a uma pergunta já de 1/03/2007, com o título A função do que. Nessa questão, é apresentado o exemplo da frase «passámos a tarde debaixo do chapéu, que o calor era insuportável», tendo sido sugerida a classificação da oração iniciada por que como subordinada causal. Ora, não me parece que esta oração pudesse iniciar a frase: *«que o calor era insuportável, passámos a tarde debaixo do chapéu».
Agradeço, desde já, a vossa resposta e todo o trabalho que têm vindo a realizar.
Resposta:
Gostaria, antes de mais, de salientar que a nossa língua não tem uma interpretação tão linear como desejaríamos, sobretudo quando estamos num contexto educativo.
Respostas únicas, inquestionáveis, integram o desejo de qualquer professor. Todavia, a língua, como a vida, não é assim tão simples. E mantém muitas franjas acerca das quais há, ainda, necessidade de investigar mais, o que não implica, porém, que da investigação saia uma interpretação unívoca. Com efeito, muitas vezes, o que da investigação nos advém é a necessidade de aceitar a diversidade. E, perante a diversidade, desde que devidamente justificada, nem sempre há argumentação que imponha, inequivocamente, uma das possibilidades.
Vale a pena salientar, também, que muitos são os investigadores e os gramáticos que consideram não existir coordenação conclusiva nem explicativa.
Acerca deste assunto, dizem Gabriela Matos e Eduardo Raposo, na recém-publicada Gramática do Português (doravante gramática da Gulbenkian), organizada por Eduardo Raposo e outros, e publicada pela Fundação Calouste Gulbenkian (no mês de outubro saíram os primeiros dois volumes). O sublinhado é meu:
«Com base num critério sobretudo semântico, a tradição gramatical luso-brasileira apresenta frequentemente um leque de conjunções e locuções conjuncionais coordenativas mais alargado do que aquele que é apresentado no quadro 1, da secção 35.3 [copulativas simples: e, nem; copulativas correlativas: nem… nem, quer… quer, não só… mas também, não só… como (também); disjuntivas simples: ou; disjuntivas correlativas ou… ou, ora… ora, quer… quer; adversativas simples: mas (p. 1787)]