Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Como se escreve a posição em que um atleta registou numa prova: «8.º da geral» ou «8ª à geral»?

Grato

Resposta:

A forma mais correta é «8.ª da geral».

A expressão subentendida pelos usos em questão é a seguinte: «8.ª posição da classificação geral». Encontramos frequentemente esta construção nas notícias sobre competições desportivas

(1) «O português José Gonçalves terminou a corrida na 14.ª posição da classificação geral [...]» ("Froome vence etapa final e torna-se líder do Giro", A Bola, 25/05/2018)

Pergunta:

Gostaria de saber qual o gentílico para a capital do Camboja, Phnom Penh, e para a capital do Vietnã, Hanói.

Desde já, agradeço.

Resposta:

Não existem formas com uso frequente ou estabilizado, mas, teoricamente, os gentílicos em questão poderão ter as formas penome-penense e hanoiense, que ainda não encontraram registo nem em dicionários nem em vocabulários ortográficos. Nestes casos, não querendo arriscar neologismos, podem empregar-se em alternativa as perífrases «os habitantes/naturais de Pnom Pene/Hanói».

Convém esclarecer que, para o nome da capital do Camboja, mais conhecido na sua forma internacional Phnom Penh, o Vocabulário Toponímico do Vocabulário Ortográfico Comum (Instituto Internacional da Língua Portuguesa), fixa a forma Penome Pene. Outros aportuguesamentos estão disponíveis: o Código de Redação do português na União Europeia estabelece a forma portuguesa Pnom Pene; também se encontra outra adaptação, mais antiga, proposta pelo Dicionário Enciclopédico Lello (1977) – Pnom Penh.

Acrescente-se que o país cuja capital é a cidade de Hanói tem, em português, duas formas: Vi...

Pergunta:

Qual é a designação correta para os habitantes e/ou nativos da localidade da Foz do Arelho (concelho das Caldas da Raínha)?

Resposta:

Em relação aos habitantes/naturais de Foz do Arelho (Caldas da Rainha), usa-se o gentílico fozense, como ilustra em exemplo retirado da imprensa da região:

(1) «Em 2006, o fozense Jaime Umbelino (escritor, linguista, docente e cronista) legou a sua casa à Junta de Freguesia local para que após a sua morte (que aconteceu em 2007) o espaço fosse recuperado e transformado numa casa-museu.» (Gazeta das Caldas, 14/09/2018)

Em relação à localidade de Arelho, no concelho de Óbidos, emprega-se arelhense, como comprova a existência de uma entidade denominada Centro Social Cultural Recreativo Arelhense.

Cf. Lista de gentílicos

Pergunta:

Retorno à consulta feita por mim e respondida em 13/02/2019, para saber qual seria a melhor escolha para a pontuação para o final da frase «Com que então, o maroto do tio Jonas enviava aquele montão de inutilidades sem ao menos apreciá-las completamente(!?)»

Ponto de interrogação ou de exclamação?

Obrigado mais uma vez.

Resposta:

As frases em que ocorre a expressão «com que então» podem exprimir um leque variado de emoções e sentimentos e realizar-se de formas distintas. Esta diversidade é codificada na escrita por diferentes sinais de pontuação, sem que se possa definir uma regra precisa, a não ser a que decorre das convenções usuais.

Assim, tais sequências podem terminar com ponto de interrogação, de modo a identificar uma frase de tipo interrogativo, que, exprimindo surpresa, não tem de ser forçosamente uma pergunta genuína:

(1) «Com que então a tua mãe continuou sempre a dar-se com a Maria Antónia?» (David Mourão Ferreira, "Tal e Qual o que Era", in Gaivotas em Terra, Lisboa, Editorial Presença, 8.ª edição, 1996, pág. 53).

No entanto, também há casos de associação de um ponto de exclamação, também a exprimir surpresa e até censura:

(3) «Com que então, só minha prima é que mereceu uma valsa! » (Machado de Assis, A Chave)

E também se encontram casos que rematam em reticências, sugerindo que mais haveria a dizer como censura trocista ou manifestação de algum desconcerto:

(4) «[...] Às vezes, lá em casa, ponho-me a pensar: o que é que sentirá uma galinha?

– Um galinha? – perguntou o engenheiro.

Pergunta:

Qual a grafia e pronunciação correctas[*]: "hemóstase" ou "hemostase"? Pronuncia-se como metástase?

As referências que encontrei [no dicionário Priberam e no sítio Educalingo] apontam para "hemóstase", mas, tendo em conta a origem da palavra (hemo+stasis), esta acentuação soa-me bizarra. 

[* Manteve-se a grafia correcta, anterior à norma ortográfica em vigor.]

Resposta:

 A forma correta é hemóstase – «ação ou efeito de estancar uma hemorragia» –, do grego haimóstasis, eós 'medicamento para reter o sangue', o que significa que o termo português mantém, do grego, também a acentuação proparoxítona (isto é, esdrúxula).

Mesmo assim, existem oscilações, como observa o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001):

«[...] sendo breve a vogal radical grega, há o pressuposto de que tais compostos devam ser proparoxítonos, mas em verdade muitos deles, por uso, são preferentemente usados como paroxítonos, sobretudo na linguagem médica em geral, havendo, porém, dentro da própria área, esforços em favor da proparoxitonia: algóstase, anástase, antiparástase, antiperístase, apocatástase, apóstase, bacterióstase, catástase, diástase, epístase, halístase, hemóstase, hipóstase, isóstase, mesóstase, metástase, perióstase, perístase, próstase, zigóstase [...].»

De qualquer forma, hemóstase é a forma que há muito se fixou em português, pelo menos, numa perspetiva erudita, fundada na filologia (cf. Vocabulário da Língua Portuguesa, 1966, de Rebelo Gonçalves, que era um classicista).