DÚVIDAS

Esparguete (Portugal) = espaguete (Brasil)

Os dicionários registam esparguete, termo mais usual em Portugal, e espaguete, considerado mais correto no Brasil.

Sendo a origem desta palavra o vocábulo italiano spaghetti (plural de spaghetto, diminutivo de spago – cordel), qual será a razão da epêntese do r em esparguete?

Na 3.ª edição (1977) do Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa de José Pedro Machado, lê-se:

Espaguete – do italiano spaghetti «macarrão fino». Há a variante esparguete, devida à influência de espargo.

E no Dicionário da Língua Portuguesa (2008) da Porto Editora encontramos, quanto à etimologia, o seguinte: do italiano spaghetti x espargo.

«E o que têm os espargos [a] que ver com esparguete, para além de haver uma óbvia semelhança na forma desses dois vocábulos?» pergunta-se aqui [Sara Leite, "Cordelinhos à Portuguesa", in blogue Língua à Portuguesa, 3/11/2008]:

«[a] A palavra “espargo” vem do grego asparagos, “espargo”, pelo latim asparagu- (Infopédia).

Será que o verbo latino spargo (espalhar) também poderá ter tido influência em esparguete?...

Fico muito grato pela vossa atenção.

Resposta

Sobre a etimologia da forma esparguete, usada em Portugal, aceita-se e é plausível a explicação dada por J. P. Machado. Ou seja, no aportuguesamento de spaghetti, operado na variedade lusa, a inserção da consoante r (a epêntese) deve-se à analogia com espargo, palavra que exibe tal consoante na posição medial.

Quanto à possibilidade de uma influência do latim spargo – do qual evoluiu espargir –, parece ela pouco provável, porque, para se verificar, teria de se ter feito sentir num meio erudito. Ora, a forma esparguete antes se afigura uma criação popular, alterada por aproximação a espargo, num processo enquadrável na etimologia popular1.

Por contraste, a forma brasileira é mais conservadora, por não fazer a referida epêntese. Poderá pensar-se que a fortíssima presença italiana no Brasil para tanto terá contribuído1, mas falta informação que possa confirmar esta conjetura.

 

1 A etimologia popular consiste na alteração da forma de uma palavra de modo a aproximá-la de outra, por se supor que existe entre elas uma relação semântica ou derivacional. É o fenómeno que ocorreu na evolução da palavra floresta, na Idade Média foresta, na qual se inseriu por analogia um l não etimológico, no pressuposto erróneo de haver uma relação com flor. Cf. "Floresta e a família de palavras flor".

2 De qualquer modo, importa assinalar que o termo italiano foi adaptado por outras línguas sem inserção do segmento r, o que terá também sido determinante na configuração menos deturpadora do aportuguesamento no Brasil.

 

Cf. Portugal e Brasil: 30 palavras diferentes mas com o mesmo significado

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