No 25.º aniversário do Ciberdúvidas, a professora Carla Marques deixa um balanço do percurso do projeto que mostra, de forma clara, a sua vitalidade e pertinência.
Doutorada em Língua Portuguesa (com uma dissertação na área do estudo do texto argumentativo oral); investigadora do CELGA-ILTEC (grupo de trabalho "Discurso Académico e Práticas Discursivas"); autora de manuais escolares e de gramáticas escolares; formadora de professores; professora do ensino básico e secundário. Consultora permanente do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacada para o efeito pelo Ministério da Educação português.
No 25.º aniversário do Ciberdúvidas, a professora Carla Marques deixa um balanço do percurso do projeto que mostra, de forma clara, a sua vitalidade e pertinência.
Nas frases «Nem sempre encontramos quem nos perceba bem» e «Raramente encontramos quem durma menos de 7 horas por noite», as orações subordinadas são substantivas relativas ou substantivas completivas?
Nas frases apresentadas, as orações introduzidas pelo pronome relativo quem são subordinadas substantivas relativas.
Estas orações caracterizam-se por não terem antecedente. Por essa razão comportam-se como um nome/substantivo (daí serem classificadas como substantivas), desempenhando as funções típicas desta classe, como sujeito (1), complemento direto (2) ou complemento indireto (3), por exemplo:
(1) «Quem tudo quer tudo perde.»
(2) «Conheço quem chegou.»
(3) «Telefonei a quem me felicitou.»
No caso das frases apresentadas, as orações subordinadas substantivas relativas desempenham a função de complemento direto e poderiam ser substituídas por grupos nominais equivalentes, que desempenhariam a mesma função na frase:
(4) «Nem sempre encontramos esta pessoa.»
(5) «Raramente encontramos esta pessoa.»
Disponha sempre!
Por que na frase «O horror da cena atraía os olhos, mas eu os desviava, talvez pensando assim: tudo desaparece, tudo é fantasia» possui aposto explicativo?
Isto é, «tudo desaparece, tudo é fantasia» sendo aposto de «assim»?
Não deveria ser considerado como objeto direto, uma vez que «assim» é adjunto adverbial, ou seja, termo acessório?
Ou será que é porque o «assim» é um termo catafórico que introduz um aposto? Se sim, quais seriam os termos catafóricos? Pensei que seriam só os pronomes demonstrativos.
A relação que se estabelece nesta frase ocorre no contexto das dependências anafóricas no plano do texto e não no plano estritamente sintático, que tem lugar apenas no interior da frase.
Neste caso, o advérbio assim assume-se como uma forma que não tem um conteúdo referencial próprio (como acontece com os pronomes de 3.ª pessoa, por exemplo) e que, por essa razão, aponta para expressões que, por seu turno, possuem esse conteúdo referencial próprio. É o que acontece em frases como (1), onde o pronome o remete para a expressão referencial «o João» e assume o seu significado:
(1) «Eu encontrei o João. Vi-o na biblioteca.»
Neste tipo de relações, diz-se que o pronome o é anafórico e depende referencialmente da expressão que surge antes.
É possível também existir uma dependência referencial relativamente a um elemento que surge depois na frase, como em (2):
(2) «Vi-o. Era o João.»
Neste caso, diz-se que o pronome o é catafórico, uma vez que remete para uma expressão referencial que surge depois na frase.
No caso da frase apresentada, o mesmo acontece com o advérbio assim, que remete para duas orações que surgem depois na linearidade da frase: «tudo desaparece» e «tudo é fantasia».
Disponha sempre!
Na frase seguinte, qual é o significado de «era ver» no começo da frase?
Podia dar-me mais exemplos dessa combinação de verbo ser e ver?
«Era ver os espanhóis todos na grande risota, alguns a mandarem umas bocas, como "limpaste o rabo, pá?".»
Muito obrigado.
A estrutura «era ver» usa-se sobretudo na modalidade oral com uma intenção enfática que tem a intenção de destacar a situação que se descreve após a construção.
Pode considerar-se que a expressão equivale a «É um espanto ver x» ou «Preste-se atenção a x». A construção também se associa, por vezes, à apresentação de uma consequência de algo que ficou expresso anteriormente.
Esta construção identifica-se em situações de comunicação atuais, mas também é possível assinalar a sua presença em textos literários representativos de outras fases da língua. Deixamos alguns exemplos extraídos do Corpus do Português, de Mark Davies:
(1) «Era ver de manhã, por todos os carreiros, estradas e carris que dão para o campo, mulheres e rapazes de saco debaixo do braço à procura do sustento do dia.» (Alves Redol, Fanga, 1943)
(2) «É ver os mais sólidos e lúcidos indivíduos chegarem ao homicídio, a negarem pai e mãe, a desconherem os filhos ou a desfazerem vidas laboriosamente construídas movidos por impulsos incontroláveis.» (Rita Ferro, Por tudo e por nada: crónicas, 1994)
(3) «É ver o que aconteceu com a Laurinda.» (Alberto Lopes,
Numa altura em que as eleições antecipadas se aproximam em Portugal, a palavra eleição foi a escolhida para a crónica da professora Carla Marques, no programa Páginas de Português, da Antena 2 (dia 9 de janeiro de 2022).
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