Aura Figueira - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Aura Figueira
Aura Figueira
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Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, variante de Estudos Portugueses e Franceses, pela Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa, com uma pós-graduação em Ciências da Documentação e da Informação, variante de Biblioteconomia. É professora de português dos ensinos básico e secundário. 

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Gostaria de saber qual é em português a diferença entre o predicativo e o atributo, já que a distinção é diferente na minha língua materna, e não consigo compreendê-la.

Resposta:

        Em Portugal, a Nomenclatura Gramatical Portuguesa, publicada em 1967 e revogada em 2004 com a publicação da Terminologia Linguística para os Ensinos Básico e Secundário (TLEBS), foi suspensa e revista, tendo vindo a concretizar-se no Dicionário Terminológico (DT), o atual instrumento regulador dos termos e conceitos relativos ao funcionamento da língua. 

         Houve, deste modo, alguns termos que desapareceram, nomeadamente, o atributo, cuja função é desempenhada por duas novas funções sintáticas:

          * Enquanto o atributo era uma função sintática exclusiva do adjetivo, os elementos que podem funcionar como modificadores restritivos do nome podem ser grupos preposicionais ou orações subordinadas adjetivascomo complementos do nome podemos encontrar também grupos preposicionais.

Pergunta:

Desde já o meu bem-haja por existirdes, pois sois de extrema importância.

Podereis, por favor, fazer a análise sintática dos elementos desta frase?

«Foi a poesia, antes da psicanálise, que nos tornou conscientes desta perturbante verdade existencial (...).»

Grata.

Resposta:

          Esta frase é um caso de construção clivada e já foi objeto de resposta aqui.

         Assim, é a seguinte a análise sintática dos elementos da frase «Foi a poesia, antes da psicanálise, que nos tornou conscientes desta perturbante verdade existencial (...)»:

  • a poesia - sujeito
  • antes da psicanálise - modificador do grupo verbal
  • nos tornou conscientes desta perturbante verdade existencial - predicado
  • nos - complemento direto 
  • conscientes - predicativo do complemento direto
  • desta perturbante verdade existencial - complemento do adjetivo

       Embora a frase apresente uma estrutura bioracional, elas são convertíveis numa só oração («A poesia, antes da psicanálise, tornou-nos conscientes desta perturbante verdade existencial.»), visto que os elementos foi e que têm como única funcionalidade destacar o sujeito da frase - «a poesia» -, pelo que não desempenham qualquer função sintática.

Pergunta:

Diz-se «preito de homenagem» ou «preito e homenagem [a alguém]»? Não será redundante qualquer destas formas, tendo em conta que «preito» já significa «homenagem»?

Os meus agradecimento pelo esclarecimento.

Resposta:

Segundo o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa, existe a expressão fazer preito e homenagem, que significa «fazer promessa de servir o seu senhor não só na guerra como na paz», ou «fazer juramento solene». O mesmo dicionário apresenta ainda a expressão render preito e homenagem a alguém, com o sentido de lhe prestar juramento de fidelidade.

Como se verifica pelas definições referidas, não há redundância, antes um alargamento de sentido, veiculado pela utilização conjunta das duas palavras.  

Fonte:

Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea. João Malaca Casteleiro, coordenador (Academia das Ciências de Lisboa). Lisboa: Academia das Ciências de Lisboa e Editorial Verbo, 2001

Pergunta:

Na frase «Tu não és nada a nossa mãe.», como classificamos a palavra «nada»? É um pronome indefinido ou um advérbio de negação?

Resposta:

         A frase apresentada pode ter mais do que uma interpretação:

  1. Tu não és a nossa mãe.
  2. Tu não tens nenhuma relação de parentesco com a nossa mãe.

        O vocábulo «nada» é um advérbio usado «em construções predicativas adjetivais ou adverbiais negativas para enfatizar a negação de determinada qualidade ou estado.= DE MANEIRA NENHUMA, DE MODO NENHUM (...) Isso não é nada difícil.» (cf. Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa). Em 1.), embora a construção predicativa seja nominal, podemos considerar que é um caso semelhante, pelo que «nada» se classificará como advérbio de negação.

         Em 2.),  a palavra «nada» é um pronome indefinido que, «em posição de complemento, usa-se em correlação com a partícula negativa não (...), sendo parafraseável por "coisa nenhuma"» (cf. Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa).

Pergunta:

Gostaria que me esclarecessem as funções sintáticas da seguinte frase:

«Júpiter era o pai dos deuses.»

Considero o seguinte:

Júpiter – sujeito;

era o pai dos deuses – predicado;

o pai dos deuses – predicativo do sujeito;

dos deuses – modificador restritivo de nome.

A dúvida é se podemos incluir o modificador restritivo de nome no predicativo do sujeito, ou se tem de ser uma função separada deste.

Desde já, o meu obrigada e os meus parabéns pelo trabalho realizado.

Resposta:

         A análise sintática da frase «Júpiter era o pai dos deuses.» é a seguinte:

        Júpiter – sujeito

        era o pai dos deuses – predicado

       o pai dos deuses – predicativo do sujeito

       dos deuses – complemento do nome

     Antes de mais, comecemos por esclarecer que os sintagmas nominais, para além do núcleo, que pode ser um nome ou um pronome, podem conter complementos e modificadores.    

    O núcleo do sintagma nominal que constitui este predicativo do sujeito é um nome («pai») considerado dependente, isto é, seleciona um complemento que lhe completa o sentido (no seu «sentido figura de maneira proeminente uma relação com outra entidade, como, p. e., amigo ou pai (de alguém)»*).

    Entre outros, pedem complemento os nomes que indicam significados relacionais, ou seja, vínculos de dependência com uma pessoa, um animal ou uma coisa, nomeadamente, nomes de parentesco, como no caso em apreço.  

Fontes:

*RAPOSO, Eduardo et al. (orgs). Gramática do Português. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2013. p. 1045

ROCHA, Maria Regina,