Ana Martins - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Ana Martins
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Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas – Estudos Portugueses, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, e licenciada em Línguas Modernas – Estudos Anglo-Americanos, pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Mestra e doutora em Linguística Portuguesa, desenvolveu projeto de pós-doutoramento em aquisição de L2 dedicado ao estudo de processos de retextualização para fins de produção de materiais de ensino em PL2 – tais como  A Textualização da Viagem: Relato vs. Enunciação, Uma Abordagem Enunciativa (2010), Gramática Aplicada - Língua Portuguesa – 3.º Ciclo do Ensino Básico (2011) e de versões adaptadas de clássicos da literatura portuguesa para aprendentes de Português-Língua Estrangeira.Também é autora de adaptações de obras literárias portuguesas para estrangeiros: Amor de Perdição, PeregrinaçãoA Cidade e as Serras. É ainda autora da coleção Contos com Nível, um conjunto de volumes de contos originais, cada um destinado a um nível de proficiência. Consultora do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa e responsável da Ciberescola da Língua Portuguesa

 
Textos publicados pela autora
Livros para inglês ler
O contributo dos textos adaptados para a aprendizagem do Português como Língua Estrangeira

A disponibilidade de textos simplificados ou adaptados têm impacto importante na aprendizagem de uma língua, mas, no domínio do Português como Língua Estrangeira (PLE), muito está por fazer, na opinião de Ana Sousa Martins, linguista e coordenadora da Ciberescola da Língua Portuguesa – em crónica  transmitida no programa Páginas de Português, da Antena 2, no domingo, 7 de outubro, às 12h30* (com repetição no sábado seguinte, 13/10, pelas 15h30).

* O programas Páginas de Português pode também ser ouvido aqui. Hora oficial de Portugal continental.

Pergunta:

«O Cortiço, de Aluísio Azevedo, é um romance naturalista.», «O cachorro soltou-se da coleira.» Na primeira oração, o termo «de Aluísio Azevedo» é um aposto explicativo? Na segunda, o termo «da coleira» é um objeto indireto, adjunto adverbial de lugar ou complemento circunstancial?

Desde já agradeço a ajuda dispensada.

Resposta:

1. «O Cortiço, de Aluísio Azevedo, é um romance naturalista.»

O constituinte sublinhado é um modificador apositivo do nome, pois:

       a)  tem um antecedente semanticamente definido;

       b)  não é identificador do SN¹ «O Cortiço», como prova o teste:

       * De Aluísio Azevedo, O Cortiço é X, mas o de António Silva, não.

2. «O cachorro soltou-se da coleira.»

O constituinte sublinhado é complemento oblíquo.

       Os testes sintáticos:

       *O que é que o cachorro fez da coleira?

        Soltou-se

       *O que é que aconteceu ao cachorro da coleira?

       Soltou-se

       Vs.

        O que é que o cachorro fez?

        Soltou-se da coleira.

        O que é que aconteceu ao cachorro?

Pergunta:

A propósito da dúvida suscitada por mim com referência à expressão abaixo, respondida na data de 22/1/2018, gostaria, como acréscimo, que fosse feita a análise sintática da frase que forneci como exemplo:

«Ele era de opinião que céu cinzento e gotas de chuva nas janelas tiram o ânimo e causam melancolia.»

Obrigado.

Resposta:

Sujeito: Ele

Predicadoera de opinião de que céu cinzento e gotas de chuva nas janelas tiram o ânimo e causam melancolia

Verbo copulativo: era

Predicativo do sujeito (realizado por um sintagma preposicional): de opinião de que céu cinzento e gotas de chuva nas janelas tiram o ânimo e causam melancolia

(Teste sintático: pode ser coordenado com outro constituinte cuja função também é de predicativo. Ex. «Ele é inteligente e da opinião de que…»)

Complemento do nome realizado por um sintagma preposicional preenchido por duas completivas finitas coordenadas: de que céu cinzento e gotas de chuva nas janelas tiram o ânimo e causam melancolia.

Sujeito (composto) da completiva 1: céu cinzento e gotas de chuva nas janelas

Predicado da completiva 1: tiram o ânimo

Verbo do predicado da completiva 1: tiram

Complemento direto do predicado da completiva 1: o ânimo

Sujeito (composto) da completiva 2: céu cinzento e gotas de chuva nas janelas

Predicado da completiva 2: causam melancolia

Verbo do predicado da completiva 2: causam

Complemento direto do predicado da completiva 2: melancolia. 

Pergunta:

Gostaria que classificassem a oração subordinada inserida na seguinte frase «Camões estava consciente de que os Portugueses desprezavam as artes» e que identificassem a função sintática que desempenha.

Muito obrigada.

Resposta:

«... de que os Portugueses desprezavam as artes» é uma oração substantiva completiva. Cumpre a função sintática de complemento do adjetivo (consciente), realizado por um grupo preposicional oracional.

Pergunta:

Minha dúvida tem a ver com a conjunção pois. Nas gramáticas normativas, nunca vi esta conjunção ser classificada como adversativa ou ser apresentada como uma conjunção de valor semântico adversativo. No entanto, em todos os dicionários que consultei (Houaiss, Michaelis, Priberam, Porto, Aulete, etc.), esse conectivo é também encarado como sinônimo de mas, porém, no entanto, etc. Devido a isso, fiquei com a pulga atrás da orelha: afinal, a conjunção pois é abonada por algum livro consagrado de gramática como sinônima de conjunções adversativas? Caso não encontrem a resposta a essa pergunta, mas creiam que o pois pode, sim, indicar oposição, gostaria que dessem exemplos (e os explicassem) para eu conseguir ensinar a meus alunos da melhor forma possível. 

Resposta:

Exemplo de pois como conjunção adversativa:
«- Estás tranquilo? Pois eu estou na maior ansiedade.»
 
O exemplo acima consta do Dicionário Houaiss, Ed.Temas e Debates.
 
Podemos acrescentar um exemplo retirado do CETEMPúblico
«Há gente neste partido que não trabalhou, pois eu trabalhei»
 
«Não é muito conhecido, tem um estilo de música independente e meio alternativo. Pois eu gosto muito!»
 
«Pois», com sentido adversativo, inicia uma unidade frásica autónoma. O estado de coisas que essa unidade representa está em contraste com o estado de coisas descrito na sequência frásica anterior, não raro através de uma forma de discurso reportado (discurso atribuído a outrem).
Trata-se de um uso do registo informal.