A. Tavares Louro - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
A. Tavares Louro
A. Tavares Louro
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Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas — Estudos Portugueses e Franceses pela Faculdade de Letras de Lisboa. Professor de Português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual o significado e a origem do seguinte provérbio: «De Espanha, nem bom vento, nem bom casamento»?

Obrigada.

Resposta:

Em Portugal, o mar é um amenizador do clima, mas, devido a Espanha ser continental e montanhosa, os ventos de leste, no Inverno, são frequentemente desagradáveis. Também durante o Verão, o vento proveniente do Norte de África, chamado suão, chega a Portugal depois de atravessar o Sul de Espanha. Por estas razões, os ventos de leste são mais secos e rigorosos que os ventos oceânicos.

Quanto à sequência em que se diz «nem bom casamento», trata-se de uma alusão histórica, devido a alguns casamentos mal sucedidos entre as coroas de Espanha e Portugal, os quais, para este país, se traduziram em comprometer a independência política. Por causa do desejo de mantermos a identidade cultural e procurarmos alguma segurança em assunto tão aventuroso, preferimos os casamentos com os vizinhos e as vizinhas, filhos e filhas de famílias conhecidas.

Pergunta:

Desde já agradeço a atenção do Ciberdúvidas.

Deparei-me com um "exercício" interessante e um pouco difícil de realizar.

Estou a traduzir de francês para português nomes aos quais é junto o sufixo -fono, como em luso + fono, e há alguns em que receio ter as minhas dúvidas. Por exemplo, falante da Indonésia será um "indonesófono", do Líbano será um "libanófono"...?

Consultei a secção do Ciberdúvidas sobre os adjectivos pátrios e tentei ver o radical dos nomes, juntando o respectivo sufixo (-fono). Será que estou no bom caminho? O meu receio é em alguns deles fazer uma má formação.

Muito obrigada.

Resposta:

Os vocábulos anglófono e francófono surgiram no século XX. Com base nestes vocábulos, surgiu lusófono. Ainda não existem correspondentes para outras línguas.

Note-se que a língua oficial do Líbano é o árabe. Neste país, muito cosmopolita e de grande intensidade comercial, residem muitos anglófilos e francófonos. Não tem, portanto, sentido falar em "libanófono", quando não existe uma língua libanesa: grande parte da população do Líbano fala árabe (é arabófona), a par de outras línguas.

A Indonésia é um arquipélago muito extenso e muito povoado. A língua oficial é o bahasa Indonesia (literlamente «língua da Indonésia»). Pertence à família malaio-polinésia, tendo sido adaptada e padronizada com base nos modelos da língua malaia e do neerlandês (ou holandês). A língua indonésia é uma das mais faladas no mundo. Neste caso, aceita-se que se crie a forma indonesiófono ou indonesófono (os antepositivos que correspondem à Indonésia e à sua língua oficial são indonésio- e indoneso-). Observe-se que, além da língua oficial, os indonésios comunicam nas línguas regionais, especialmente o sundanês e o javanês.

Pergunta:

Gostaria de saber qual o processo de formação da palavra perfeito e se na nossa língua existem palavras derivadas com dois prefixos.

Muito obrigada.

Resposta:

A palavra perfeito proveio do vocábulo latino perfectu(m), que contém o prefixo per, que significa «ao longo de», e o elemento fectu(m), relacionado com o verbo facere, que está na origem do verbo fazer.

Na história da língua portuguesa, têm surgido muitos verbos derivados de um mesmo radical. Por exemplo, re/fazer, des/fazer, etc.

Pergunta:

Oiço muitas vezes a expressão «supra-sumo da batata», mas também já ouvi «supra-sumo da barbatana». Qual a forma correcta?

Obrigada.

Resposta:

A comunicação oral abrange vastos domínios. Frequentemente, usamos as palavras para brincarmos com os nossos amigos.

Em português europeu, a expressão «supra-sumo da barbatana» é a forma mais antiga e serve para  mostrarmos a irrelevância de algum objecto ou de algum feito. A expressão «supra-sumo da batata» é uma variante mais recente. A sua utilização tem justificação devido ao baixo valor por quilo das batatas em relação a outros produtos alimentares.

As variantes das expressões populares são comuns quer nas suas ocorrências regionais quer nas suas ocorrências ao longo dos tempos.

Pergunta:

Recebi uma mensagem electrónica do meu banco em que o assunto era «Acuso de recepção». Embora compreenda o sentido do eventual galicismo, a expressão pareceu-me estranha. Gostaria de saber se ela é admissível ou se haverá outra mais adequada para o mesmo efeito.

Resposta:

A expressão «acuso de recepção», em que acuso é um substantivo, não é usual.

Note-se, no entanto, que o presente do modo indicativo dos verbos usar e abusar também funciona como substantivo: «o uso» e «o abuso.

Para mantermos a linguagem corrente, poderemos usar formas comuns como: «informação da recepção de documentos», «declaração da recepção de documentos», etc.

A comunicação comercial deve ser feita em linguagem corrente para ser facilmente compreensível.