No mundo da comunicação, a precisão linguística não é apenas uma questão de estética, é essencial para a clareza e a precisão da informação transmitida. Recentemente, em 18/04/2024, lia-se, no oráculo do programa 360º, da RTP, um erro ortográfico gritante: «os europeus não vassilaram no apoio». Na verdade, a ortografia correta do verbo é vacilar, cujo étimo latino se grafa vacillāre, com o significado de «movimentar-se para um lado e para o outro por não estar firme ou seguro; não ter um sentimento, uma opinião ou uma atitude totalmente segura, certa, firme ou definitivamente estabelecida; perder a intensidade, a força ou o vigor; não conseguir decidir entre dois sentimentos, opiniões ou atitudes; estar indeciso, duvidoso, incerto ou hesitante» (Dicionário da Língua Portuguesa da Academia das Ciências de Lisboa).
Este erro, que envolve a troca dos ss por c, ou vice-versa, não é tão raro como se possa pensar. Na verdade, é um dos equívocos mais comuns na língua portuguesa. A confusão surge porque tanto o ç e o c antes de e ou i quanto os ss podem representar o mesmo som – /s/ –, portanto, sem nenhuma distinção na pronúncia. Além disso, existem exemplos de palavras homófonas que podem intensificar a confusão, como é o caso de paço e passo, concerto e conserto, conselho e concelho.
No entanto, não se pense que sempre foi assim. O português, como muitas outras línguas, passou por várias mudanças fonéticas ao longo dos séculos. Até ao século XVI, o grafema s indicava um som que linguisticamente descrito como consoante fricativa apical – é o som que caracteriza vários dialetos setentrionais em Portugal, tradicionalmente apelidado de «s beirão». Os grafemas ç e c antes de e ou i representariam o mesmo som sibilante surdo que é hoje o do português padrão contemporâneo em palavras como caça, cinto, sapo, pensar ou isso. Por outras palavras, aproximadamente até ao tempo de Camões, paço não soava como passo, nem conselho se confundia foneticamente com concelho.
Se a diferenciação tivesse persistido, a distinção ortográfica seria hoje certamente mais clara. No entanto, as mudanças ocorridas devido a uma combinação de fatores linguísticos, culturais e sociais influenciaram a evolução do português. Por isso, em português, todo o cuidado é pouco com as sibilantes: é que, para um mesmo som, a ortografia pode variar significativamente.
Possa a atenção dos profissionais da comunicação mediática nunca vacilar – sempre com c! – em matéria ortográfica...