Sobre um danoso lapsus linguae que foi tudo menos um lapso. Texto inserto no jornal “i” de 13/04/2012.
O ministerioso lapso tão danoso para os bolsos dos funcionários públicos e dos reformados [em Portugal] foi tudo menos um lapso, mas não houve um único jornalista que chamasse a atenção para isso. Política à parte. “Lapsus”, em latim, significa «escorregadela».
A escorregadela acontece, é inevitável. As pessoas não pedem desculpas pelo inevitável. O que a ministeriosa figura quis dizer é que tinha errado, tinha escorregado, tinha derrapado, estava desgovernado e tinha caído desamparado, e que só por ter nascido malabarista estava a tentar erguer-se para continuar a sua actuação. Pelos erros — que são evitáveis e acontecem — espera-se que as pessoas peçam desculpa.
Os dicionários dizem que o lapso pode ser fruto da distracção, do descuido ou do desconhecimento. É definitivo, embora possa acontecer mais de uma vez, ou até mesmo periodicamente. É assim que se entende o lapsus calami (engano de escrita), o lapsus linguae (engano de fala) e ainda o lapsus carni (o engano da carne, pecado mortal, ou, por extensão, o acto sexual, rude e normalmente expresso por uma palavra de quatro letras principiada por “f”).
In jornal "i" de 13 de abril de 2012, na coluna semanal do autor, Ponto no i. Manteve-se a grafia de 1945, seguida ainda pelo jornal.