No contexto da campanha para as eleições nos Estados Unidos, o candidato e ex-presidente Donald Trump tem marcado o seu percurso pela utilização de todos os instrumentos de persuasão que tem ao seu dispor. Entre eles, têm lugar de relevo as armas de natureza linguística, que lhe têm permitido atacar a sua adversária, Kamala Harris, e dirigir-se ao seu eleitorado com promessas ou ataques associados sempre a discursos inflamados, pejados de léxico ofensivo e agressivo.
No seu comício em Nova Iorque, em 27 de outubro de 2024, Trump mobilizou a metáfora da guerra para trazer a palco o que considera o problema maior do país: a imigração. Recordemos que a metáfora é um recurso retórico com imensa força persuasiva, que tem a capacidade de estruturar uma dada visão da realidade que, por vezes, é construída de forma automática pelos falantes que ouvem ou leem um dado discurso. Este universo criado pelos falantes que recorrem à metáfora é, muitas vezes, recebido de forma acrítica e passiva.
Assim, quando Trump afirma que um exército de imigrantes está a desenvolver uma campanha de violência e de terror contra os norte-americanos, está a estabelecer um paralelismo entre a situação vivida (real ou ficcional) e uma realidade de guerra. Tal é conseguido por meio de recursos lexicais como os nomes exército, campanha, violência e terror, que, neste contexto, ativam a metáfora de guerra. A aproximação da situação de imigração à guerra é feita com a intenção de convocar conhecimentos prévios dos falantes: o contexto de guerra e os medos, perigos e ameaças que este envolve. Os imigrantes são, neste quadro metafórico, apresentados como o inimigo, visto como um todo ameaçador, composto por pessoas que têm todas os mesmos comportamentos e todas são movidas pelos mesmos interesses (os maus, compreenda-se). Os norte-americanos são o povo invadido, o povo ameaçado (os bons, portanto), que deve fazer tudo para se defender.
Neste contexto, Trump declarou que, mal chegue à presidência, vai declarar a Lei Marcial, a qual só em situações de grande emergência se convoca. Esta lei insere-se naturalmente na metáfora de guerra criada, pois aponta para uma realidade em que as autoridades militares assumem o controlo do poder administrativo e judicial no sentido de restaurar a ordem. Será por meio desta medida que, na ótica de Trump, os americanos vão «ganhar a guerra», pois ela permitirá «deportar imigrantes em massa», livrando o país invadido do invasor e pondo um fim ao conflito e à ameaça.
Esta metáfora delirante está, não obstante, a contagiar os apoiantes de Trump que aceitam como real o mapeamento conceptual que a metáfora de guerra está a criar, o que poderá revelar-se muito perigoso dado que passar das palavras aos atos é fácil e as palavras são de guerra. Não nos esqueçamos!