Está em voga dizer uma poeta portuguesa. Ainda esta semana isto se ouviu e leu, no programa Os Grandes Portugueses, da RTP-1.
No entanto, a forma poeta, como nome capaz de designar género masculino e género feminino, não se encontra registada em nenhuma gramática ou dicionário. Aprendemos todos na escola que o contraste de género, para além do recurso a formas terminadas em - a (pintor — pintora, aluno — aluna), se pode fazer através de palavras diferentes: pai — mãe; profeta — profetisa; actor — actriz.
Então porquê a poeta?
Há já a tendência para aceitar as duas formas de feminino: embaixatriz (esposa de embaixador) e embaixadora (mulher que está à frente de uma embaixada). Mas então o que fazer à palavra rainha? Porque há rainha, soberana de um Estado, e rainha, mulher do rei. Argumenta-se também que Natália Correia se designava a si própria como poeta. Mas este argumento não é válido porque a língua é comunitária e não muda por acção de um falante isolado.
O que se passa é que o par o poeta — a poetisa refere pessoas de sexos diferentes a exercer uma mesma actividade e o par o poeta — a poeta refere a mesma coisa e faz guerra preventiva a quem achar o contrário.
É certo que a língua evolui para colmatar necessidades comunicativas dos falantes de uma dada comunidade. Mas também não é menos certo que, outras vezes, ela é simplesmente moldada para se afeiçoar a ideologias.
*in "Sol", coluna "Ver como se diz", 20 de Janeiro de 2007