«Tive muita sorte de ser seu contemporâneo, mestre, dividindo com o senhor a mesma linha do tempo, e ainda ser acolhido por sua imensa generosidade.»
O nosso último grande gramático normativo tradicional nos deixou ontem [22/05/2025).
Porém, quando a morte nos tira um homem assim, não consegue levar consigo todo o impactante legado de influência, lucidez, humildade e sabedoria a nós transmitido, possibilitando o surgimento de uma nova geração de gramáticos normativos conscientes do seu dever.
A herança. É isso que vence a morte.
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Certa vez, em São Paulo, março de 2014, quando o mestre Bechara participou de uma conferência com os professores Francisco Platão Savioli e Maria Helena de Moura Neves, eu estava lá para admirá-lo pela primeira vez. Nunca havia estado diante de um gigante. O que mais me impactou, contudo, foi o seu jeito de ser, sua candura, seu humor refinado – sempre aquele sorriso no rosto. Lá, pude conversar com o professor ao fim da palestra e lhe entregar minha gramática, pensando que ele nem a leria. Incrivelmente, não só leu como me ligou no mês seguinte para tecer elogios ao meu trabalho. Fiquei sem palavras. Um ano depois o convidei para escrever a contracapa da minha obra. Adivinha? Nem pensou duas vezes. Aceitou e escreveu. Como pode isso?
Tive muita sorte de ser seu contemporâneo, mestre, dividindo com o senhor a mesma linha do tempo, e ainda ser acolhido por sua imensa generosidade. Um homem admirável, cheio de vida, verdadeiramente culto. Um referencial de equilíbrio entre a tradição e a inovação.
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Na última vez em que estive com ele, 12/01/2024, quase completando seus 96 anos, pude apertar-lhe a mão com firmeza, olhar nos seus olhos sempre amáveis e, emocionado, lhe dizer assim:
– Mestre, eu só queria lhe agradecer tudo o que o senhor fez por nós, professores de Português. Muito obrigado pela sua gentileza, pela sua humildade, pelo seu conhecimento compartilhado com a gente. Muito obrigado!
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Se queremos homenageá-lo da maneira certa, precisamos valorizar os seus escritos, as suas obras, sempre aprendendo com aquilo que ele nos legou.
Assim, mesmo não sendo imorrível, continuará sendo imortal!
Que Deus o receba em paz, mestre!