« (...) De acordo com o retrato sociolinguístico [da Guiné Equatorial] recolhido por Scott Smith e publicado em 2020, o espanhol é a língua oficial de facto, usado na educação e em todos os documentos do governo. (...)»
Apesar de ser um país pequeno em território e população, a Guiné Equatorial (GE) tem três línguas oficiais, o espanhol (desde a independência, com uma interrupção na década de 1970, durante a ditadura de Francisco Macías Nguema), o francês (oficializado em 1998) e o português (oficializado em 2010). A GE situa-se no Golfo da Guiné e é constituída por um território continental, Mbini, e por várias ilhas, a saber, Bioco (antiga Fernão Pó, onde fica a capital, Malabo), Ano Bom (a sul de São Tomé e Príncipe) e, ainda, Corisco, Elobey Grande e Elobey Pequeno. No total, o território da Guiné Equatorial perfaz 28 051 km2, com uma população, à data do censo de 2016, de pouco mais de 1 220 000 habitantes.
A ligação da GE a Portugal vem dos finais do século XV, época da descoberta e tomada pelos Portugueses. Em 1641, a Companhia Neerlandesa das Índias Orientais estabeleceu-se em Fernão Pó, mas a ilha foi recuperada em 1648. Com a assinatura do tratado de El Pardo (1778), Portugal cedeu a Espanha as ilhas da GE juntamente com os direitos de tráfico de escravos e de livre comércio num setor do Golfo da Guiné, entre os rios Níger e Ogoué, além da Colónia de Sacramento, no atual Uruguai; em troca, Portugal retomou a ilha de Santa Catarina, na costa brasileira, que havia sido tomada pelos Espanhóis em 1777. A Guiné Espanhola manteve-se até 1968, ano da independência do país. A ligação a Portugal encontra-se também espelhada linguisticamente no crioulo de base lexical portuguesa, o fá d´Ambô (falar de Ano Bom), falado por menos de dez mil habitantes da ilha de Ano Bom. Esta ligação foi, de resto, amplamente usada como argumento pelas autoridades da GE aquando do pedido de adesão à CPLP.
De acordo com o retrato sociolinguístico recolhido por Scott Smith e publicado em 2020, o espanhol é a língua oficial de facto, usado na educação e em todos os documentos do governo. O francês é mais usado no continente e ao nível dos assuntos regionais, dado a GE ser um dos estados-membros da Comunidade Económica Monetária da África Central (CEMAC). O português não é falado no país. Em Malabo e por toda a ilha de Bioco, a língua dominante é um crioulo de base lexical inglesa, chamado «pidgin da Guiné Equatorial», também conhecido como pichi ou pichinglis, que tem vindo a expandir-se na costa ocidental de África, entre a Serra Leoa e os Camarões; a sua variedade de prestígio é a língua materna dos fernandinos, descendentes de escravos libertados da Serra Leoa e da Libéria, que foram voluntários no estabelecimento da primeira colónia britânica em 1827. São, ainda, faladas várias línguas bantas da família Níger-Congo na GE, para cujas denominações nem sempre se encontram equivalentes em português, casos em que usarei as designações encontradas em The Ethnologue, em itálico. A língua maioritária da GE é o fangue, falada por cerca de 80% da população, originária da região continental, mas levada por migrantes para Bioco e imposta à maioria da população da GE durante a ditadura de Macías (1968-1979); esta língua estende-se também aos Camarões, Gabão e Congo. A língua bubi é falada em Bioco e a língua benga, na ilha de Corisco. Os playeros da zona costeira continental, além do benga, falam o iyasa, o kombe e o bapuku ou batanga; nas zonas semicosteiras, são falados o baseke ou seki, o bisió ou kwasio, o bagiéli ou gyeli. Muitas destas línguas são transfronteiriças, faladas sobretudo no Gabão e nos Camarões; algumas, como o bagiéli ou o baseke, estão em risco de extinção.
Cf. Guiné Equatorial cumpriu 10 anos de “embaraço” na CPLP + Sem Ano-Bom, a Guiné Equatorial não tem nenhum vínculo com a CPLP + Seixas da Costa diz que CPLP não funciona e que Brasil não se empenha na organização
Artigo da linguista e professora universitária portuguesa Margarita Correia transcrito, com a devida vénia, do Diário de Notícias de 8 de abril de 2024.