1. Portugal viveu no dia 28 de abril uma situação de apagão generalizado, que se estendeu a toda a Península Ibérica. Às 11h30 (hora de Lisboa), todo o sistema elétrico deixou de funcionar, gerando o caos nos transportes, nos aeroportos e colocando em risco o sistema de saúde. Anunciou-se que o abastecimento de água poderia não estar assegurado e que a reposição do sistema elétrico poderia demorar. O medo da escassez de alimentos gerou as reações mais intempestivas, levando a que nos supermercados se esgotassem os bens alimentares enlatados, papel higiénico e água engarrafada. Felizmente, o abastecimento de eletricidade foi sendo reposto gradualmente e o dia 29 já amanheceu com a promessa de regresso à normalidade. Neste evento sem precedentes, a palavra em destaque foi apagão, um termo que merece duas reflexões no plano linguístico. Por um lado, a análise feita ao léxico mobilizado na comunicação social vem mostrar que o lexema português substituiu definitivamente (pelo menos neste caso) os termos ingleses com os quais competia – blackout e shutdown. Por outro lado, importa compreender a origem e semântica da palavra apagão. Esta deriva, segundo o Dicionário Houaiss, do espanhol apagón, formado a partir da base verbal apag(ar), a que se junta o sufixo -ón (-ão, em português), que expressa o resultado de uma ação, presente em nomes como apertão, arrastão ou esticão, por exemplo. Assim, ao contrário do que poderia parecer, a palavra apagão não corresponde ao grau aumentativo de um nome cujo grau normal teria uma forma como *apaga (que não existe). Trata-se, sim, de um nome deverbal que pode ser usado coloquialmente para referir a suspensão temporária de um dado serviço (informático, de telecomunicações...) ou também a perda temporária de memória ou de consciência (Infopédia). Este acontecimento veio demonstrar a importância da rede elétrica para o estilo de vida moderno, no qual grande parte das atividades desenvolvidas e serviços disponíveis dependem da existência de eletricidade.
2. No Vaticano, o conclave que irá proceder à eleição do novo papa está agendado para o dia 7 de maio e prolongar-se-á até que o novo bispo de Roma tenha sido escolhido pelos seus pares, o que será sinalizado com fumo branco e a tradicional expressão latina «Habemus papam» («temos papa»), que anuncia oficialmente ao mundo católico a eleição do novo papa. Enquanto não chega esse momento, vive-se o tempo de «missas novendiais» (do latim novemdiales), expressão que designa o período de nove dias durante o qual se realizam missas de sufrágio ao papa falecido. Até à chega do novo papa, a Igreja vive o chamado período de «sede vacante» (do latim sedes vacans, "trono vazio"), expressão que designa o intervalo de tempo durante o qual se está sem papa. Nesta época, é tempo ainda de recordar o legado do Papa Francisco, que também deixou marcas na língua, como é o caso da expressão «todos, todos, todos», usada pelo papa na Jornada Mundial da Juventude, em Lisboa, no ano de 2023, para recordar que a Igreja não exclui ninguém. A este propósito, a consultora Inês Gama procede à análise linguística do lexema todos, evidenciando a sua versatilidade, neste apontamento.
3. A atualização do consultório integra uma breve exposição dedicada a alguns aspetos etimológicos que podem contribuir para explicar a formação do topónimo Manho (ou Manhos). No plano lexical, reflete-se sobre aspetos relacionados com a «cor de coral» e, no plano sintático, analisa-se a correção da coocorrência dos termos «Ninguém... não» numa frase e a adequação da estrutura «ter dúvidas se». No âmbito do quadro gramatical brasileiro, propõe-se uma análise para o adjetivo na frase «Enamorou-se, jovem, de Gabriela» e esclarece-se sobre como classificar a locução «tão pouco».
4. No âmbito da rubrica dúvida da semana, a professora Carla Marques explica por que razão a construção «*Ele faz o que gosta» está incorreta e analisa possibilidades para a sua correção, num apontamento também divulgado no programa da Antena 2, Páginas de Português. Na mesma linha de correção dos usos, o consultor Paulo J. S. Barata, reflete, num texto divulgado no Pelourinho, sobre qual o termo correto: chicana ou "chincana"?
5. Cotejando o léxico usado no português do Brasil com formas do português europeu, o consultor Fernando Pestana recorda que muitas formas consideradas "brasileirismos" advêm da variedade europeia, um aspeto que por vezes as limitações da memória linguística tende a encobrir.