A influência do quimbundo na língua portuguesa circunscreve-se aos falantes da região de Luanda-Malanje.
No tempo colonial a língua quimbunda era considerada um dialecto local submetido à língua portuguesa. A escolaridade era feita em português mas em Luanda havia um estrato social africano alfabetizado que sabia kimbundu, por relação familiar, onde tinham importância fundamental os mais velhos.
Os colonos portugueses urbanos (homens) absorveram sobretudo palavrões do quimbundo (sundu ia maié; tuji, munhungo, kitatas, uandala ku beula?) que deveriam envergonhar (!) o tal relacionamento intercultural de que alguns falam. Esses palavrões eram sobretudo utilizados para humilhar as mulheres negras, tratadas por muitos colonos como seres prioritariamente disponíveis para o sexo, em contraponto com a «seriedade» das mulheres brancas. Hoje em dia essas relações terminaram. Ficou a língua portuguesa, uma língua nova com sotaque próprio, diferente do de Portugal e do Brasil, que recorre a expressões de quimbundo diversas. Só fazendo uma estada em Luanda e falando com os seus habitantes se pode analisar esse novo linguajar que ainda não está bem estudado.
Vou dar um exemplo. Em Portugal, pelo que tenho ouvido, a velhice é, regra geral, tema de chacota e desprezo. Ser velho é ser desprezado. Há tempos assisti à discussão entre duas mulheres e uma, para insultar a outra, chamava-lhe «velha!». Isto para mim é bárbaro. Em Angola a velhice é objecto de respeito. Um «mais velho», um «kota» é alvo do maior respeito. Quando num autocarro entra uma pessoa que aparenta mais idade do que a nossa, nós damos-lhe lugar. Eu sou tratado por muita gente por «kota», por «mais velho», em sinal de respeito. Mas o «kota» é também uma pessoa cuja experiência de vida tem muito para nos ensinar.
Uma «avó» em Luanda não é a nossa avó, mas é a avó de todos nós. Uma vez aqui em Portugal eu chamei «avó» a uma senhora velhota e ela sentiu-se insultada, respondendo-me que ainda não tinha idade para ser minha avó.
Uma das palavras assumidas pelo português de Luanda é «maka». Por exemplo, quando há um problema numa rua, as pessoas juntam-se e discutem o assunto, ás vezes apaixonadamente, isso pode ser uma «maka», e se houver muita confusão, uma «kanvanza».
Em conclusão: duas línguas que se falam na mesma região e que as relações coloniais viraram uma contra a outra, isto é, segundo a minha opinião, línguas de desigualdade, de conflito. Essa ideologia ainda perdura em muitos casos. Tende-se a menosprezar o quimbundo, como língua de «atrasados», para se aderir ao português, a língua «dos mais claros».
Faço notar que as minhas opiniões são baseadas na vivência e na análise, mas quem não concordar ou tiver vivência de outro tipo, por favor, não me poupe, para concordar comigo já basto eu.