DÚVIDAS

Rima rica e rima pobre

Antes de mais, felicito-os pelo excelente trabalho que fazem em prol da língua portuguesa.

De forma geral, aprendemos na escola que rima rica é aquela em que o autor utiliza palavras de diferentes categorias; rima pobre, aquela em que são usadas palavras da mesma categoria gramatical. Porém, recentemente, tenho visto outras designações tais como «rima rica é a que requer igualdade de sons vocálicos e consonânticos a partir da última vogal tónica». Outros autores rejeitam por completo rica e pobre, devido à conotação negativa que a última pode ter.

Resumindo:

1. Existem as denominações de rima rica e rima pobre?

2. Se sim, como se distinguem?

3. Se não, como classificar os versos que terminam em bonita (adj.)/saltita (v.), vão (v.)/são (v.), feliz (adj.)/infeliz (adj.), ordem (n)/sacodem (v.)?

Muito obrigada pela atenção recebida.

Resposta

Em primeiro lugar, aconselha-se que veja as respostas já existentes sobre rima rica e rima pobre e, também, sobre rima perfeita.

Respeitando a ordem das questões apresentadas,

1. Rima rica e rima pobre são designações que fazem parte da terminologia específica usada para classificar dois dos casos particulares da área da rima, que, por sua vez, pertence ao domínio da versificação. Tratando-se de uma área que representa a correspondência, a «identidade ou semelhança de sons em lugares determinados dos versos» (Celso Cunha e Lindley Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, 17.ª ed., Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 691) —, correspondência essa que emerge de forma diversa, a rima surge classificada com várias designações de valor dicotómico, tais como: consonância, rima soante ou consoante (quando a correspondência dos sons é completa) e assonância, rima toante ou assonante (quando há conformidade apenas da vogal tónica); rimas masculinas (rimas agudas) e rimas femininas (graves); rima toante perfeita (coincidência de sons e não de letras) e rima imperfeita (quando não há identidade absoluta entre os sons dispostos em rima, quer soante, quer toante); rima pobre, rima rica e, também, rima rara ou preciosa (as excepcionais, difíceis de encontrar, em que, às vezes, «o poeta procura a raridade não só no campo fonético, mas também no morfológico», idem, p. 695).

2. A distinção que apresenta entre a rima rica e a pobre não está desactualizada. Segundo Cunha e Cintra, «consideram-se pobres as rimas soantes feitas com terminações muito correntes do idioma, principalmente as da mesma classe gramatical, [como] é o caso, por exemplo, dos infinitivos em –ar, dos particípios em –ado, dos gerúndios em –ando, dos diminutivos em –inho, dos advérbios em –mente, dos adjectivos em –ante, dos substantivos/nomes em –ão e –eza, da palavras primitivas com os seus derivados por prefixação: amor-desamor, ver-rever, etc.» (idem, p. 694) e ricas «as rimas que se fazem com palavras de classe gramatical pouco diferente ou de finais pouco frequentes» (ibidem, p. 695), embora alguns metricistas reservem tal classificação para «as rimas com consoante de apoio, do tipo dia-irradia, sombra-assombra» (ibidem).

3. Tendo em conta esta terminologia, há rima pobre em vão (v.)/são (v.) e feliz (adj.)/infeliz (adj.), rima rica em bonita (adj.) /saltita (v.) e, penso que se pode considerar, rima rara ou preciosa em ordem (n.)/sacodem (v.).

O facto de não haver referências a nível da rima no Dicionário Terminológico (recurso da Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular, Portugal) assegura-nos que não há alterações terminológicas nesse campo, mantendo-se os termos da tradição gramatical.

Fonte: Celso Cunha e Lindley Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, 17.ª ed., Lisboa, Sá da Costa, 2002.

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