DÚVIDAS

O complemento dos nomes em -dor e -tor

Em muitos manuais é definido que não há complemento nominal para substantivos concretos, porém, tenho encontrado uma abordagem alternativa que vou transcrever. Ela é correta?

«Substantivo concreto de raiz verbal terminados em “-dor” e “-tor” + a expressão 'DE + NOME': a) Será Complemento Nominal se o substantivo equivale a uma oração adjetiva: (1) Prenderam o matador de animais. [= que mata animais = or. adjetiva] (2) Premiaram o comprador de garrafas. [= que compra garrafas = idem] (3) Foi indiciado o falsificador de passaportes. [= que falsifica passaportes = idem] (4) Identificaram o assassino do comerciante. [= que assassinou o comerciante = idem] (5) Ele foi vendedor de livros. [= que vendia livros = idem] b) Será Complemento Nominal se o substantivo tem o significado de instrumentos, ou seja, a seres não-animados: Quebrador de nozes. Detetor de metais. Amassador de alho. Aparador de papéis.» 

Obrigado

Resposta

    Relativamente ao conteúdo da transcrição que o consulente apresenta, ele está parcialmente correta. Cabe, pois, dizer o seguinte:

     1. Existem, de facto, nomes que selecionam um complemento. Os complementos do nome podem ter a forma de grupo preposicional (não oracional) de + nome, sobre os quais incide a sua questão, e podem ainda ter forma de grupo preposicional oracional (A ideia de conhecer o presidente agrada-me).

     2. A seleção de complemento pelo nome não decorre, exclusivamente, do nome ser concreto ou abstrato (características semânticas do nome), mas, sobretudo, das suas características morfossintáticas.

    Assim, os nomes deverbais em –dor ou -tor derivam de verbos transitivos e de uma subclasse de verbos intransitivos, os inergativos (verbos intransitivos genuínos, segundo a tradição gramatical luso-brasileira, como dançar, nadar,…). O sufixo de base destas nominalizações deverbais exprime uma relação de agente.

    Os nomes deverbais de verbos transitivos têm complemento, à semelhança do que se passa com o verbo.

     Assim, o teste que deve utilizar é este:

       (1)  O João mata animais. / (Prenderam) o matador de animais.

       (2)  O João compra garrafas. / (Premiaram) o comprador de garrafas.

       (3)  Ele falsifica passaportes. / (Interrogaram) o falsificador de passaportes.

       (4)  Ele assassinou o comerciante./ (Identificaram) o assassino do comerciante. (não termina em –dor, mas é um nome agentivo).

       (5)  Ele vende livros. /Ele (foi) vendedor de livros. 

  Quando se faz a derivação, o nome agentivo traz consigo o complemento verbal, o qual, na nominalização, é dado pela estrutura sintática de + nome.

  O mesmo se passa com o segundo grupo de exemplos, dado tratar-se também de nominalizações de verbos transitivos. As etiquetas «concreto» e «instrumento» são semânticas, como já foi dito.

        a) Este objeto deteta metais./ Foi adquirido um novo detetor de metais.

  Repare que os nomes derivados de verbos intransitivos não aceitam informação redundante, não selecionam complemento, mas sim modificadores.

  Veja-se que a) e  b) são frases agramaticais , mas e c) é gramatical :

          a) *O cantor de canções românticas.

          b) *O nadador de piscinas.

         c) Adoro aquele cantor de fado. O constituinte de fado em c) é um modificador restritivo do nome e não um complemento.

  Quanto ao teste  apresentado para identificação do complemento do nome, repare que o pode aplicar, tanto a nomes deverbais de verbos transitivos (que selecionam complemento), como de verbos intransitivos (que não selecionam complemento): Encontrei o nadador ( = sujeito que nada); fotografei o cantor (= sujeito que canta).

 

[Para outros contextos, vide tema relacionado aqui, Edite Prada.]

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