Estar com o particípio passado transformado
Na frase seguinte, qual é a função da palavra transformado?
«Os dois primos adoravam o velho celeiro que estava transformado em garagem.»
Na frase seguinte, qual é a função da palavra transformado?
«Os dois primos adoravam o velho celeiro que estava transformado em garagem.»
Na frase em apreço, a primeira questão que se coloca é a de saber se transformado é um particípio ou uma forma adjetival. Embora as construções com o verbo estar gerem estruturas com fronteiras ténues entre o adjetivo e o particípio, pensamos, neste caso, estaremos perante um particípio, pelo que transformado integra uma forma verbal composta.
Recordemos que os verbos que implicam temporalidade, quando surgem em orações copulativas com os verbos ficar ou estar, estão integrados numa chama frase passiva resultativa. De acordo com Veloso e Raposo, «[e]stas orações descrevem um estado - de natureza física, fisiológica ou mental - da entidade representada pelo sujeito da frase, um estado que resulta de um processo de mudança sofrido por essa entidade a partir de outro estado; por isso, ao estado que resulta da mudança dá-se o nome, na área do aspeto, de estado consequente ou estado resultativo»1. Quando o verbo copulativo da frase é estar, apresenta-se este estado resultativo «de forma estática, sem qualquer componente semântica que remeta para o processo de mudança, a qual é apenas inferível a partir do sentido do particípio e de informação pragmática que tem que ver com o nosso conhecimento do mundo e das circunstâncias da situação descrita»2.
Note-se que, em muitos casos, os particípios perdem a sua natureza verbal ao aparecerem em frases copulativas com os verbos estar e ficar. Daí resulta que sejam usados como particípios adjetivais, assumindo um comportamento entre o adjetivo e o particípio. Nestes casos, tipicamente a forma participial não é compatível com o constituinte que tem a função de complemento agente da passiva e perde em parte o seu significado eventivo, como parece acontecer com a forma transformado, na frase (2):
(2) «?O velho celeiro estava transformado pelos primos em garagem.»
A ténue distinção entre adjetivo e particípio observa-se no facto de os adjetivos atribuírem uma propriedade episódica ao nome, enquanto os particípios assinalam temporalmente o início de uma situação3.
Ora, no caso em apreço, o particípio transformado tende para a marcação do início de uma nova situação:
(3) «Os dois primos adoravam o velho celeiro que estava (agora / finalmente) transformado em garagem.»
De acordo com esta interpretação, e embora sublinhemos que estamos perante uma situação fronteira entre particípio e adjetivo, consideramos que, na frase em apreço, transformado integra uma frase passiva, na qual o complexo verbal «estava transformado», é uma forma composta por verbo auxiliar seguido de particípio.
Disponha sempre!
? assinala a construção de aceitação duvidosa.
1. Veloso e Raposo in Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, p. 1484.
2. Idem, ibidem.
3. Idem, ibidem, pp. 1485-1486.