A construção apresentada não é correta porque deveria incluir uma preposição antes do verbo ser. Assim, a frase deveria ser construída tal como se apresenta em (1):
(1) «Sobre o filho, o pai pensava: José, sim, sempre cuidando das obrigações como gente de bem que lhe tinha ensinado a ser!»
Como refere Luft, o verbo ensinar, quando construído com infinitivo rege preposição, devendo obedecer à estrutura «ensinar alguém a fazer algo»1.
A frase apresentada é ainda particular pelo facto de incluir um caso de movimento relativo longo2, o que dificulta a análise sintática da estrutura.
Nesta frase, encontramos uma oração relativa que tem uma oração completiva encaixada no seu interior, como se demonstra pelos parênteses retos em (2):
(2) «Sobre o filho, o pai pensava: José, sim, sempre cuidando das obrigações como gente de bem [que lhe tinha ensinado [a ser [-]]]!»
O sinal [-] representa o espaço que o pronome relativo ocupa na frase, o que nos permite observar que este não desempenha uma função sintática dependente do verbo ensinar, mas sim do verbo ser. A estrutura presente na frase em análise é, assim, equivalente à que se indica em (3):
(3) «[ele] tinha-lhe ensinado a ser gente de bem»*
Deste modo se conclui que o pronome relativo que desempenha a função de predicativo do sujeito no interior da oração completiva infinitiva que se encontra encaixada na oração relativa tomando como antecedente o sintagma nominal «gente de bem».
Nesta construção, o que não é tão comum (pelo menos em análises escolares) é o facto de o relativo se deslocar da sua oração para a cabeça da oração superior, a relativa. É a este fenómeno que alguns autores dão o nome de movimento relativo longo2.
Disponha sempre!
1. Celso Luft, Dicionário prático de regência verbal. Ática, p. 252
2. Peres e Móia, Áreas críticas da língua portuguesa. Caminho, p. 284.
* Nota (27/01/2023) – Sobre o uso do verbo ensinar com os pronomes o/a e lhe no Brasil, Celso Pedro Luft, no Dicionário Prático de Regência Verbal, observa o seguinte: «No Brasil, o contraste o/lhe = culto/vulgar sugere a preferência, no registro formal ou tenso, por ensiná-lo a + Infinitivo; o mesmo valendo naturalmente para ensiná-lo/ensinar-lhe (sem compl. de coisa).»